Minha mãe reaproveitou uma garrafinha com um bico muito específico para molhar os vasinhos de violeta. A improvisação tem a finalidade de imprimir delicadeza à atividade. Fez isso porque as plantas são muito sensíveis, e a água precisa ser dosada com precisão. Então, nos dias certos, ela para por alguns instantes, com todo o cuidado, para realizar a tarefa. É um jeito lindo de se preocupar com as (mínimas) coisas.
Violetas não podem ser molhadas em abundância, precisam de luminosidade e se adaptam melhor a ambientes que não são abafados. para cultivá-las em apartamento, como é o caso, são necessários alguns poucos cuidados para que a planta siga linda e saudável. Não entendo nada de violetas, mas com um mínimo de interesse e observação, consigo saber o que agrada às plantinhas.
Por isso, não entendo como as pessoas podem ser indiferentes umas às outras. E, infelizmente, o mundo está cheio de gente que tenta se convencer que está acima de tudo, com o umbigo sendo o centro do universo. Olhar para si é fundamental, mas ignorar o outro é triste. Aí pode entrar qualquer tipo de desculpa: a correria, a pressão, a falta de tempo... Sobram gestos forçados e likes nas redes sociais, falta verdade e reciprocidade.
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Ninguém precisa ser o mais entendido, o mais curioso ou invasivo para tratar os outros de forma real e gentil. Levando em consideração que o outro tem fragilidades e problemas tais quais eu tenho, e está tudo bem. Não são as dificuldades que também nos aproximam?
Quando entrei no jornal, em 2003, tínhamos um diretor – Luís Fernando Zanini – que era uma das raras pessoas, que tratava todo mundo bem e com proximidade – fossem executivos, fossem iniciantes. Sabia os nomes dos familiares, o time do coração, alguma referência de vida de cada um. Sempre achei essa atitude admirável e lembro dele com carinho. Como não guardá-lo na memória com o melhor dos sentimentos?
Por isso que o cuidado banal com as violetas tocou tanto a mim, como se fosse um fio condutor necessário da vida. Às vezes, precisamos parar e nos dedicarmos ao outro e, mais especificamente, às necessidades do outro. Em que momento fazemos adaptações possíveis para garantir o bem-estar alheio — sem perdermos, sem nos anularmos, sem que o olhar atento seja um sacrifício?
No exemplo da planta, o óbvio se revela: quando o cuidado faz sentido por ele mesmo, as flores aparecem. E é assim que deve ser, naturalmente.
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