Pois é, até quem tem muita fé, aquela fé de mover montanhas vai morrer. Um dia há de sumir desse plano, deixando só memórias no coração de quem fica, lembranças que ressoam nos lugares onde esteve e uma porção de impressões digitais nos livros lidos. Pra quem crê que há vida depois daqui, fica o consolo de que morrer não é a sentença final. É só uma vírgula no meio do caminho.
Quem ama desmedidamente, aquele amor sincero, de quem se doa sem esperar nada em troca, há de tropeçar em indiferença e ingratidão. Porque o amor não é um tanque blindado que a tudo resiste, é uma redoma de vidro, uma película fina e, aliás, transparente, porque permite atravessar a luz, mas não impede o coice. O consolo é que o amor sempre vence e reverbera, apesar dos desamores que se perdem pelo caminho da saudade.
O novo ano novo também será marcado por uma série de injustiças. Ainda mais nesse tempo estranho em que o mesmo fato se desdobra em dois ou três atos, de certa forma, insanos, antagônicos e bizarros, como em uma peça que imita a pior parte do teatro do absurdo. Crendo ou não na Bíblia, a história nos conta que haverá sempre um injustiçado crucificado, que não receberá o perdão dos seus irmãos. O consolo é que o sol nasce pra todos e a inverdade é sempre desvelada pela Justiça, que tarda, mas não falha.
Sinto dizer, mas muitos perderão o fio de dignidade que os sustenta. Seja porque cederão à vilania, à corrupção (em todos os níveis) ou porque serão alvejados pela ignorância alheia, jogados à sarjeta enquanto estendem a mão por um punhado de súplicas. É perverso, mas há quem só encontre o pão em meio ao lixo, ou a paz da opressão no meio da ilusão entorpecida em uma noite vazia. Sabe que apesar dessa insensatez, eu creio que sempre haverá uma piedosa e humilde alma que, contra tudo e contra todos, se assim for preciso, vai lutar pra resgatar os indignos, confortando os inconsoláveis.
E como ser feliz, apesar do caos, dos tapas na cara desferidos por um cotidiano, por vezes áspero e arredio, dos coices que as desilusões provocam, dos golpes de adagas afiadas, geralmente pelas costas, desferidos por quem deixou esvair os últimos resquícios de humanidade ralo adentro? Não há receita. Talvez a primeira e mais preciosa dica seja encarar a frustração de frente, lavar o rosto, sacudir a poeira, pôr em prática a fé, amar incondicionalmente, exercendo a justiça, com solidariedade e empatia. O resto a gente compra num armazém qualquer.
Feliz 2023, 2024, 2025, 2026...