
Na última terça-feira (18), a Câmara de Vereadores de Caxias do Sul aprovou por unanimidade a criação da Frente Parlamentar Cristã. Apesar de declarações de boas intenções manifestadas pelos proponentes, considero essa ação um equívoco, em mais um capítulo da perigosa mistura entre política e religião que cresce hoje no Brasil.
Felizmente, vivemos em um país com diversidade religiosa, onde a Constituição garante liberdade a todos os tipos de crenças e respeita, inclusive, o direito daqueles que não querem seguir nenhuma religião. Este é um ponto fundamental da democracia brasileira, e aí se coloca a primeira questão: você está proporcionando isonomia e liberdade ao ligar um parlamento à pauta de um grupo religioso específico? Obviamente, não.
Usar o Legislativo para “promover discussões e ações que atendam às necessidades e aos anseios da comunidade cristã”, como expõe o requerimento de criação da frente, ilustra isso. E mesmo que se alegue respeito à diversidade cultural e religiosa, o fato é que um espaço público que vai abrigar um órgão que contempla apenas uma crença.
Alguém poderia argumentar que outras representações religiosas, se quisessem, também poderiam solicitar a criação de frentes parlamentares. Mas, para mim, não é essa a questão. A Câmara não deve ser espaço para proselitismo de nenhum grupo religioso, nem de cristãos nem dos outros, e deve se concentrar nas necessidades e anseios de toda a comunidade, priorizando a busca de soluções para problemas do dia a dia. A religião, por seu caráter pessoal, é assunto que deve ser tratado por cada um, com toda a liberdade, em sua casa, grupo social ou templo.
Por fim, surpreende de que a criação da Frente tenha sido aprovada por unanimidade na Câmara. Infelizmente, nenhum parlamentar teve tino ou disposição para debater a medida com profundidade, o que seria útil para preservar, inclusive, a imagem do parlamento, que não deve ter sua atuação política misturada com questões religiosas.
Pensando bem, levando em conta o histórico recente da Câmara de Caxias, essa postura não surpreende. Vale lembrar que, nos últimos anos, os parlamentares da cidade optaram por não cassar um colega que proferiu ofensas racistas na tribuna (e que foi condenado pela Justiça por esse ato), instituíram o pagamento de 13º salário para eles mesmos e ampliaram o número de assessores.
Bem diferente da Câmara que, décadas atrás, foi pioneira em ações como o fim da remuneração por sessões extraordinárias, cortes de privilégios internos e banimento da contratação de parentes. Outras cabeças e outros tempos, bem melhores.