Por Eduardo Uhlein, desembargador do TJRS
Envergar a toga, símbolo de integridade e circunspecção na atividade da Justiça, nunca foi ceder ao clamor das multidões ou às vozes que buscam se impor pela força. É, por essência, um exercício contramajoritário, que desafia pressões em nome da concretização dos direitos fundamentais, observadas as linhas traçadas pela Constituição Federal e pela lei.
A cena pública das sustentações orais e dos debates em plenário pode sugerir o ápice da argumentação jurídica, marcada por retórica intensa, emoção e parcialidade. Mas é no silêncio dos gabinetes, longe dos holofotes, que o magistrado analisa provas, refina alegações, interpreta os fatos à luz do ordenamento jurídico e, com serenidade, decide.
A sentença não busca aplausos nem adesões fáceis. Sua função é resistir ao arbítrio, coibir abusos, garantir direitos e preservar a ordem jurídica como fundamento da vida em sociedade. Afirma que há regras, que a lei vigora, e que o Estado democrático de direito permanece sendo o pilar da convivência civilizada.
O debate sobre os limites da atuação judicial é sempre legítimo, mas não deve redundar em equiparações indevidas
Por isso, soa grave — e injusta — a retórica que acusa o Poder Judiciário de instalar uma “ditadura da toga”. Ao contrário da força bruta, da exceção e da mordaça a calar as liberdades de expressão em suas diferentes naturezas, marcas dos regimes autoritários, o Judiciário opera dentro dos limites legais, com motivação pública, transparência, controle recursal e obediência à Constituição. É esse compromisso que sustenta o equilíbrio institucional e protege a sociedade das tentações autoritárias, quaisquer que sejam suas origens.
O debate sobre os limites da atuação judicial é sempre legítimo, mas não deve redundar em equiparações indevidas e que depreciam a importância fundamental do Judiciário como guardião da Constituição e do regime democrático.
Em tempos de incerteza como os que vivemos, exige-se que se escolha entre o que é certo e o que é fácil. Que todos os que integram as instituições democráticas, inclusive as que representam a cidadania e a advocacia, saibam reconhecer essa escolha — e o valor de defendê-la.