Por Rodrigo Trindade, juiz auxiliar da presidência do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS)
A proposta de reduzir a jornada de trabalho tem provocado um dos debates mais relevantes dos últimos anos. Para muitos, trata-se de ideia radical; para outros, é atualização necessária diante das transformações tecnológicas e sociais do nosso tempo. Mas, afinal, o que está em jogo nisso tudo?
Toda geração teve sua batalha pela redução do tempo de trabalho, desde a conquista do descanso semanal remunerado até a limitação de oito horas diárias, passando por férias e intervalos pagos. O que a nova proposta traz é seguir esse longo movimento.
O Brasil está entre os países que mais exigem horas de trabalho dentro do G20, mas sem reflexos positivos aparentes. Ao contrário: jornadas extensas geram esgotamento, aumentam o adoecimento mental e dificultam a mobilidade social, pois consomem tempo para estudar, investir e empreender.
Essa discussão convida a refletir sobre o modelo de sociedade que queremos
A tecnologia também pesa na equação. Nos últimos 30 anos, avanços em automação, inteligência artificial e trabalho remoto vêm mudando a forma como produzimos. Há um grande chamado de atualização da legislação, permitindo que a produtividade gerada pela tecnologia garanta mais tempo livre e melhor qualidade de vida. Muitos países e empresas já experimentam jornada reduzida, e os resultados são promissores.
Há, no entanto, pontos que precisam de atenção. A proposta atual prevê período de adaptação de um ano, mas será suficiente para setores mais sensíveis? Além disso, questões como baixo valor de horas extras e risco da pejotização precisam ser enfrentadas.
Mais do que uma mudança na rotina, essa discussão convida a refletir sobre o modelo de sociedade que queremos. O trabalho é fundamental, mas não pode consumir toda a vida humana. Se há espaço para produzir o mesmo em menos tempo, por que não permitir que quem produz usufrua desse ganho? O Brasil tem longo histórico de resistência a avanços sociais, mas chegou o momento de encarar esse debate de frente. Afinal, reduzir a jornada não é sobre trabalhar menos — é sobre viver melhor.