Por Eduardo Neubarth Trindade, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers) e doutor em medicina
O filósofo alemão Immanuel Kant ensina que “não enxergamos a realidade tal como ela é, mas sim conforme os filtros da nossa percepção. Nossa compreensão do mundo não é um reflexo puro dos fatos, mas o resultado de como organizamos e interpretamos as informações ao nosso redor”. Você já deve ter ouvido, em diversas ocasiões, que temos presos de mais no Brasil. E que o superencarceramento seria uma das causas do aumento da violência nas grandes cidades.
O que precisamos é de mais investimento na formação médica
Você provavelmente também já ouviu que a crise na saúde pública do Brasil decorre da falta de médicos. E que, para resolver o problema, teríamos que formar cada vez mais profissionais, mesmo que isso signifique, em algum momento, abrir mão da qualidade em nome da quantidade. Interessante.
E se eu disser que a diferença entre a população carcerária e o número de médicos no Rio Grande do Sul não lotaria a maior parte dos auditórios onde semestralmente se formam centenas de novos profissionais? Segundo dados de 2024, o Estado tem 45,7 mil detentos. E mais de 40 mil médicos. No entanto, a percepção é de que temos muitos presos e poucos médicos.
Sem entrar no mérito de avaliar se estamos, como sociedade, prendendo demais, já que não tenho conhecimento para tal conclusão, afirmo com convicção que, definitivamente, não temos médicos de menos. O que precisamos é de mais investimento na formação médica. Melhor planejamento dos gestores públicos. E melhor prevenção no saneamento e na atenção básica.
Formar melhores profissionais é não apenas necessário pelo viés da boa prática da medicina, mas também economicamente melhor para o país, já que um profissional mais capacitado é capaz de diagnósticos mais precisos, que provocam menos retrabalho e exames desnecessários.
Ao resolver essa equação, prestando melhor serviço de saúde à população, vamos descobrir que isso pode resultar em um efeito colateral surpreendente: a redução da massa carcerária, pois onde a presença do Estado leva a dignidade por uma porta, a violência sai pela outra.
Ah... A resposta para a pergunta que inspirou este artigo? É uma questão de percepção. Qual é a sua?