Por Gabriel Wainer, apresentador do @RivoNews
Estou na Polônia para aprender mais sobre o Holocausto. São quase oito horas da noite e neva em Cracóvia. No relógio, a temperatura marca -1ºC, mas a sensação térmica é de -6ºC. É um frio que dói não só no osso, mas na alma.
Me disseram, antes de vir, que eu me despedisse de mim mesmo, pois ninguém volta igual depois de Auschwitz
Passei o dia inteiro entre os campos de concentração de Auschwitz e Birkenau, verdadeiras indústrias de extermínio de judeus, ciganos, testemunhas de Jeová, homossexuais, pretos, neurodivergentes, pessoas com deficiência física e qualquer um que ousasse questionar a o regime nazista. Protegido do clima hostil por camadas e mais camadas de roupa, estive nos barracões onde milhões enfrentaram o inverno com um pijama listrado e sapatos de madeira. Inevitável sentir-se culpado.
Me disseram, antes de vir, que eu me despedisse de mim mesmo, pois ninguém volta igual depois de Auschwitz. Corredores inteiros com cabelos humanos e sapatos de crianças fazem o estômago embrulhar e amolecem as pernas. No livro das vítimas do nazismo, encontrei 558 pessoas com o sobrenome Wainer e senti como se conhecesse cada uma delas. Imaginei quantos seríamos se não tivessem sido aniquilados como pragas.
Tive a honra de conhecer o campo com o filho de um sobrevivente. Ichak Luftglass passou por seis campos de concentração. Em Auschwitz, teve o número 174.097 tatuado no braço após ser recepcionado pelo aberrante nazista Josef Mengele, que morreu impune. Depois disso, foi confinado ao pavilhão 18, onde seu filho rezou o kadish em sua homenagem, um raro momento de beleza diante da exposição de tanto sofrimento.
O filho dele, Márcio, me contou que seu pai só saiu do Brasil duas vezes depois de ter se estabelecido por lá. Na segunda vez, voltando de Israel, ao tocar o solo brasileiro fez como seu conterrâneo, o Papa João Paulo II, e beijou o chão. Era grato pela acolhida da nossa gente quando mais precisou.
É este o Brasil que orgulha a comunidade judaica deste país. O Brasil de Oswaldo Aranha, de Henry Sobel, de Ichak Luftglass, que honra sua tradição de acolhimento, justiça e respeito à diversidade, construindo pontes entre culturas e reafirmando seu compromisso com a liberdade e a dignidade humana. E não o Brasil que endossa o terror.