Por Ida Vanessa D. Schwartz, professora titular da UFRGS, presidente da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica (SBGM) e coordenadora do (Instituto Nacional de Doenças Raras (InRaras)
Fevereiro é o mês destinado à conscientização sobre doenças raras. A definição brasileira diz que, para uma doença ser considerada rara, ela deve afetar não mais do que 65 indivíduos entre 100 mil. De acordo com o Ministério da Saúde, as doenças raras são condições crônicas complexas, pois têm duração maior que 12 meses, afetam pelo menos um órgão ou sistema de forma grave, requerem atenção e acompanhamento especializado, estão fora de perspectiva de cura e têm alto custo e impacto para as pessoas afetadas, para as famílias e para os sistemas de saúde.
O fato da maioria das doenças raras serem incuráveis acende um debate sobre a definição de cura
O fato da maioria das doenças raras serem incuráveis acende um debate sobre a definição de cura. Os reducionistas entendem a cura como a eliminação do agente causal de uma condição, mas uma "'doença'" nunca é unifatorial, ela é um balanço entre causas externas e a reação interna do corpo. Cada pessoa reage de uma maneira diferente ao mesmo agente etiológico. Ou seja, cada um tem a "'doença'" da sua maneira. Este entendimento é importante inclusive quando falamos de terapias para condições ditas comuns, como o câncer: algumas estimulam o nosso sistema imunológico, e trazem um "'controle'" da doença, não a sua eliminação. Existe, também, um conceito psicológico de "cura", que inclui a aceitação da condição, a manutenção da esperança e a busca pela felicidade "'apesar'" da existência da doença.
O surgimento de terapias efetivas para doenças genéticas raras depende do aumento do nosso conhecimento sobre a condição: não existe como tratar sem conhecer. A ciência séria não é feita com pressa. Medicamentos não podem ser liberados no mercado sem passar por todos os testes necessários, o que leva tempo, e isto é necessário para nossa proteção.
A terapia gênica, uma estratégia de tratamento recentemente aprovada pela Anvisa, para casos específicos de Distrofia Muscular de Duchenne, parte do princípio de que uma doença genética é causada somente por uma mutação em um gene _ caso este gene seja de alguma forma corrigido, haveria a cura. Mesmo na teoria, isto está longe de ser verdade: a terapia gênica não é a terapia da cura, ela é uma terapia que pode auxiliar no tratamento de algumas condições genéticas tornando o quadro mais crônico e estável por um período desconhecido. Como qualquer outra terapia, a terapia genica pode funcionar _ ou não _ em indivíduos que têm a mesma condição. Depende de cada um.
Neste mês de fevereiro, enfatiza-se a necessidade de que as doenças raras sejam entendidas não somente como condições genéticas, mas como condições de saúde crônicas complexas, e que necessitam de atendimento multidisciplinar.