Por Roberto Rafael Dias da Silva, professor da Escola de Humanidades da Unisinos
No decorrer da última semana adquiriu bastante repercussão a decisão tomada pela Secretaria de Educação, do Estado do Rio Grande do Sul, em estabelecer um regime de progressão parcial para as escolas estaduais. A portaria prevê que os estudantes que venham a reprovar em até duas áreas do conhecimento — em até dois componentes curriculares por área — sejam promovidos para a série seguinte.
Um primeiro aspecto é que naturalizamos, nas últimas décadas, a necessidade de um nível de exigência capaz de sustentar uma grande máquina de triagem
Obviamente que não se trata da primeira iniciativa de progressão parcial no âmbito estadual, uma vez que as heranças da escola progressista sempre acompanharam o desenho da escola gaúcha. A premissa de que a reprovação não é garantia de aprendizagem (muito menos de interesse ou de desejo de aprender!) é validada pelas teorias de aprendizagem e de desenvolvimento humano desde a segunda metade do século 20.
Mesmo que a proposição não seja inédita, gostaria de pensar um pouco mais sobre os estranhamentos coletivos que acompanharam nossa reflexão nos últimos dias sobre esta temática. Um primeiro aspecto é que naturalizamos, nas últimas décadas, a necessidade de um nível de exigência capaz de sustentar uma grande máquina de triagem. Muitos contextos educacionais ainda defendem a perspectiva de que o sucesso advém estritamente do esforço individual e que isto poderia fortalecer nossas capacidades coletivas para enfrentar as demandas contemporâneas. Nossos resultados educacionais — seja em exames de larga escala, seja em escutas aos cotidianos escolares — apontam para a debilidade deste raciocínio.
Por outro lado, caberia acrescentar outro aspecto: nossa cultura pedagógica tem sido incapaz de promover a diferenciação pedagógica e, principalmente, de acompanhar as trajetórias estudantis dos setores da população que, pela primeira vez, estão concluindo a educação básica. Alargamos o tempo de permanência de adolescentes e jovens na escola (mais que dobramos a longevidade escolar nas últimas cinco décadas) e, pelos próximos anos, a gestão pedagógica dos sistemas de ensino requer bastante sensibilidade.
Precisamos construir ferramentas de acompanhamento das trajetórias educativas destes sujeitos que sejam mais complexas e apresentem maior potencial explicativo para o contexto de democratização em curso. Enfrentar a cultura da reprovação é um gesto corajoso; porém, insuficiente! Construir uma nova cultura de aprendizagem demanda um cotejamento entre as dimensões do acolhimento, do acompanhamento das experiências formativas e da valorização das vozes dos estudantes.