Não param de surpreender as descobertas sobre a sofisticação da atuação das facções, o quanto se infiltram em instituições e atividades econômicas e as alianças que distintos grupos firmam para agir e prosperar. A maneira como se estruturam e espalham tentáculos faz da cooperação entre diferentes órgãos vinculados às áreas de justiça e segurança uma necessidade cada vez maior. Da mesma forma, a troca de informações e a atuação conjunta dos setores de inteligência dos governos estaduais e da União passam a ser imprescindíveis para o combate à delinquência organizada.
Uma atuação associada das forças da lei terá mais chances de fazer frente a essas facções
Uma operação comandada pelo Ministério Público (MP) paulista na semana passada mostrou que o PCC, a maior facção do país, controlava duas empresas de ônibus que fazem o transporte coletivo na principal cidade brasiliera. Suspeita-se de que as companhias – vencedoras de processos licitatórios para prestar o serviço – foram formadas com dinheiro oriundo do grupo criminoso. Um negócio de utilidade pública, essencial para parcela significativa da população, era usado para lavar dinheiro obtido com o tráfico de drogas e grandes roubos.
As descobertas da operação, batizada de Fim da Linha, ilustram a grande capacidade dessas facções de expandir as suas operações, utilizando uma fachada legal. A ofensiva, que acabou em quatro prisões, 29 denunciados por diversos crimes e 52 mandados de busca e apreensão, foi fruto de quatro anos de investigação. Cerca de R$ 700 milhões teriam sido movimentados. Foram bloqueados bens na ordem de R$ 680 milhões Tratou-se de um trabalho conjunto de MP, Receita Federal e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). É um exemplo que demonstra a importância da parceria entre diferentes instituições e níveis do poder público.
Também na semana passada, a Polícia Civil gaúcha, em associação com as corporações de Santa Catarina, Paraná e São Paulo, deflagrou a Operação Squadrone. A ação trouxe à tona uma espécie de consórcio entre uma facção do Rio Grande do Sul e outra catarinense para facilitar a negociação e o transporte de drogas e ainda a compra de armas no Paraguai. São recorrentes as informações que surgem de alianças entre grupos criminosos de diferentes regiões. Outra vez, a cooperação entre Estados permitiu a prisão de 23 pessoas, sendo uma em Portugal, e o bloqueio de 26 contas bancárias. O Ministério da Justiça se somou à ofensiva.
Ainda na semana passada, em entrevista ao jornal O Globo, o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, há pouco mais de um mês no cargo, fez um chamado. Com grande experiência na atuação contra o crime organizado em São Paulo como promotor, disse ser necessário algum tipo de pacto entre União e Estados incluindo Judiciário, MP e polícias. Ao mesmo tempo, o ex-procurador-geral de Justiça de São Paulo ressaltou a importância de despolitizar o tema.
A visão de Sarrubbo vai ao encontro do espírito das operações da semana passada, com troca de informações pelos setores de inteligência e ações coordenadas. Também está alinhada ao anúncio recente do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud), que reúne os Estados das duas regiões, de formar uma coalização para melhor combater essas megaquadrilhas. O crime organizado, afinal, avança na costura de alianças inter-regionais e se camufla cada vez mais em atividades formais. Uma atuação associada das forças da lei terá mais chances de fazer frente a essas facções com asfixia financeira, estrangulamento da lavagem de capitais e identificação de infiltrados no poder público. Um combate efetivo requer ir muito além de ações ostensivas nos subúrbios. Caso contrário, se estará apenas enxugando gelo.