Nos pronunciamentos públicos, parece existir outra vez boa vontade para a conclusão do acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia (UE), negociado desde 1999. Chegar a um bom termo, no entanto, depende de as duas partes transigirem. Sobretudo, aceitarem ceder em exigências que, no fundo, são protecionistas.
Os entraves existentes são bem menores do que os benefícios econômicos e geopolíticos para os dois blocos
Em Bruxelas, na Bélgica, para a 3ª Reunião de Cúpula da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e da UE, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, ressaltou a intenção de fechar um acordo “equilibrado” ainda neste ano. No mesmo tom, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, falou em “o mais rápido possível”. É preciso colocar esta disposição em prática.
De um lado, não são razoáveis as novas exigências apresentadas pela UE no início do ano, criando inclusive sanções caso o Mercosul – o que na prática se refere ao Brasil – não atinja as metas de redução de desmatamento. Os compromissos brasileiros nesta seara são voluntários, e, especialmente em relação à Amazônia, os números do primeiro semestre demostram uma queda de 33% no desflorestamento. No fundo, o que há é uma resistência dos agricultores europeus, menos competitivos, em especial dos franceses.
Por parte do Mercosul, há oposição particular do governo brasileiro à possibilidade de empresas europeias participarem de licitações para compras governamentais em igualdade de condições com as companhias locais. Lula, à frente da presidência rotativa do Mercosul, insiste que este é um instrumento para, por exemplo, promover política industrial. Essa reserva de mercado, porém, não impediu o setor de paulatinamente perder competitividade ao longo dos anos.
Os entraves existentes são bem menores do que os benefícios econômicos e geopolíticos para os dois blocos, que respondem por cerca de 25% do PIB global e somam mais de 750 milhões de habitantes. Para o Mercosul, em especial para o Brasil, a abertura comercial significa acesso privilegiado ao exigente mercado do Velho Continente, com redução ou eliminação de tarifas, inclusive de produtos agrícolas. É uma diversificação importante para o país, que nos últimos anos concentra muito de suas vendas para a China. Para a Europa, os ganhos também são significativos. Especialmente no longo prazo, estreitando relações com uma região do mundo que é estratégica para a transição energética verde. Uma das metas dos europeus é diminuir a dependência da Rússia e fazer frente à influência global chinesa. O anúncio da UE de que vai investir o equivalente a R$ 242 bilhões na América Latina e no Caribe nos próximos anos faz parte desta estratégia.
Em 2019, após 20 anos de negociações, os dois blocos anunciaram estar acertados nos termos do acordo, mas em seguida a resistência europeia ao avanço do desmatamento, tratado com desdém pelo governo brasileiro, travou a implementação. À época, o então Ministério da Economia estimava que o PIB do país poderia ter o incremento de US$ 87 bilhões em 15 anos. Os números podem não ser os mesmos, mas dão a dimensão da importância do tratado.