Volta a causar preocupação o nível de dificuldade da população em honrar as suas dívidas. É uma angústia para os próprios cidadãos em apuros financeiros e um fator a mais a dificultar a retomada da economia, por enfraquecer o consumo. Dados da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado (Fecomércio-RS) apontam que, em janeiro, 36,4% das famílias de Porto Alegre estavam inadimplentes. É o maior percentual para o mês dos últimos cinco anos e 0,3 ponto percentual acima de dezembro.
No curtíssimo prazo, aguarda-se para conhecer os detalhes do programa Desenrola, prometido pelo governo federal
Pode parecer pequena a variação ante o último mês de 2022. O início do ano também é um período de gastos extras, como IPTU e relacionados à volta às aulas. Mas deve-se levar em conta que a conjuntura que contribui para essa situação persiste. Não é um problema da Capital ou do Estado, mas de todo o país. A inflação segue alta e resiliente. Os juros estão em patamares estratosféricos. A atividade econômica dá sinais de arrefecimento e, apesar da melhora do mercado de trabalho nos últimos meses, os ganhos dos trabalhadores não avançam a ponto de fazer frente ao aumento dos preços. Sabe-se que uma inflação elevada corrói o poder de compra e diminui a renda disponível para consumo.
É um quadro que fica ainda mais dramático para quem tem dívidas e, pior, enfrenta dificuldade de quitá-las. Os juros altos tornam as condições financeiras desses compromissos mais sufocantes e, assim, a bola de neve vai se avolumando. Para as famílias de baixa renda, as dificuldades ficam ainda mais patentes devido ao custo para se alimentar. Observe-se que, pelo IPCA-15, enquanto o índice geral tem alta de 5,63% em 12 meses até janeiro, a variação dos alimentos e bebidas é de 10,61% – quase o dobro.
A solução para essa circunstância é complexa e deve ser conjugada. Passa pela melhora do ambiente macroeconômico. Uma maior segurança quanto à sustentabilidade das contas públicas seria capaz de fazer a inflação ceder no médio prazo, criando espaço para o Banco Central (BC) começar a cortar juro. Isso faria os agentes econômicos retomarem a confiança no reaquecimento da atividade, descortinando um novo círculo virtuoso.
No curtíssimo prazo, aguarda-se para conhecer os detalhes do programa Desenrola, prometido pelo governo federal. A previsão era apresentar a iniciativa até o final de fevereiro, mas o tema sumiu do noticiário nas últimas semanas. Foi um dos principais compromissos da campanha eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pelas informações disponíveis, será voltado para a população que ganha até dois salários mínimos e com débitos vencidos há mais de 180 dias ao final do ano passado. Assim, poderia beneficiar cerca de 50 milhões dos 70 milhões de brasileiros hoje negativados.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a declarar que o programa estava formatado, aguardando apenas a apreciação e a aprovação de Lula. Pelo jeito, diante de outras premências, o tema não se tornou tão urgente assim. Mas deveria ser, para dar um respiro a milhões de brasileiros inadimplentes. No entanto, a solução definitiva passa por um novo ciclo de crescimento da economia, duradouro e inclusivo. Caso contrário, pode ser um alívio fugaz.