O pouco tempo de preparação para o encontro entre os presidentes do Brasil e dos Estados Unidos tornava pouco provável o anúncio de acordos concretos e ambiciosos. Mas poucas horas antes da conversa entre Luiz Inácio Lula da Silva e Joe Biden surgiram informações de que os EUA confirmariam a entrada no Fundo Amazônia, destinado à proteção da porção brasileira da maior floresta tropical do mundo. Criou-se, assim, a expectativa de um aporte significativo no mecanismo, que acabou frustrada.
A questão climática é global, mas é de grande importância também para o Brasil
No comunicado conjunto divulgado pelo Itamaraty, foi citado que a Casa Branca trabalhará com o Congresso para aprovar a destinação de recursos e, genericamente, houve o anúncio de um “apoio inicial”. Extraoficialmente, da ordem de US$ 50 milhões. Pouco, de fato, ante as promessas de Biden que, ainda durante a campanha eleitoral, chegou a sinalizar desembolsos de US$ 20 bilhões.
É natural, no entanto, que o tema tenha de ser submetido ao Congresso, apesar de certa imprevisibilidade quanto ao desfecho das negociações devido à maioria oposicionista dos republicanos na Câmara. Mas a disposição de Washington de colaborar financeiramente é positiva. Pode funcionar como estímulo para outras nações ricas fazerem o mesmo. Afinal, se uma das prioridades das nações desenvolvidas é de fato frear o aquecimento global e os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas, devem apoiar com recursos iniciativas voltadas a uma redução drástica do desmatamento na Amazônia. Sem o aporte relevante de recursos, a tarefa será ainda mais desafiadora. É imprescindível passar do discurso à prática.
A Noruega é a grande financiadora do fundo, com uma participação menor da Alemanha. Hoje são cerca de R$ 3,4 bilhões disponíveis, após o congelamento da verba no governo Bolsonaro devido a discordâncias quanto à gestão dos recursos. Agora, há sinalizações também de que França, Reino Unido e Suíça poderiam contribuir. São boas as perspectivas, portanto.
É necessário lembrar que as ações não podem se resumir à repressão aos crimes ambientais. Deve-se ter iniciativas robustas que auxiliem atividades econômicas vinculadas à preservação para incluir a população da região. Um exemplo recente é o caso dos garimpeiros expulsos da terra yanomami. Muitos estavam ali por falta de opção. Sem outras perspectivas, provavelmente voltarão a atividades ilegais.
O encontro de Lula e Biden teve grande componente simbólico pelas agendas semelhantes, como a defesa da democracia, a transição energética, a proteção ambiental e os direitos humanos. Outro assunto espinhoso foi o conflito no leste europeu. Ao fim, reforçaram-se os laços diplomáticos quase bicentenários entre Brasil e EUA e houve a percepção de uma convergência construtiva. Agora, é aguardar a evolução dos pontos conversados, como uma governança global sobre o clima.
Os dois países são democracias, regime em que a alternância de poder é rotineira e saudável. Assim, deve ser cultivado o espírito de colaboração constante, imune a preferências pessoais dos governantes de ocasião. Isso não significa alinhamento automático ou subserviência. Cabe ao Itamaraty a defesa dos interesses do Brasil, e a soberania sobre a Amazônia é um deles. Mas a questão climática é global, o que torna a cooperação ainda mais premente. E é de grande importância para o país. Tanto pela oportunidade de receber investimentos quanto pelo fato de que a preservação da floresta úmida é essencial para o regime de chuvas que ajuda a fazer do agronegócio responsável um dos grandes motores da economia nacional.