É aguardada para as próximas semanas a formalização do acordo sobre como os Estados serão ressarcidos pelas perdas de arrecadação com ICMS devido à desoneração de combustíveis, energia elétrica e telecomunicações feita pelo Congresso no período que antecedeu as eleições, no ano passado. Felizmente, parece existir boa vontade de todas as partes envolvidas nas tratativas, especialmente da União, que terá de fazer o reembolso. A recomposição, é preciso lembrar, foi prevista em lei e, portanto, o que resta é definir a fórmula do acerto de contas.
Foram vários os alertas de que a caridade com o chapéu alheio, movida por interesses eleitoreiros, teria consequências ruins
A perda de receitas oriunda da diminuição abrupta das alíquotas eleva as dificuldades dos Estados, especialmente de unidades da federação ainda em situação delicada, como o Rio Grande do Sul. O ICMS, afinal, é a principal fonte de arrecadação tributária para os executivos estaduais e parte é ainda repassada para os municípios. O Conselho Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Consefaz) estima perdas de R$ 45 bilhões. No caso gaúcho, seriam cerca de R$ 5,7 bilhões que deixaram de entrar nos cofres no ano passado.
É um montante considerável, que amplia as dificuldades na gestão das finanças. A secretária da Fazenda do Rio Grande do Sul, Pricilla Santana, afirmou na quarta-feira que as perdas fazem o Estado não ter condições de assegurar neste ano uma revisão geral dos salários do funcionalismo, sob pena de desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Compreende-se a aflição que a notícia causa aos servidores, que enfrentam grande perda de poder aquisitivo ao longo dos anos. Mas ao Piratini cabe seguir a legislação e ter cuidado para não agravar, ainda mais, o desequilíbrio estrutural nos próximos exercícios, perdendo os resultados positivos obtidos pelo esforço recente, com reformas e privatizações.
Obviamente, a União não fará o desembolso de uma única vez. Trata-se de soma elevada. Projeta-se que cada unidade da federação tenha uma solução particular, e no caso do Rio Grande do Sul, como cogitou o próprio governador Eduardo Leite, é possível que o Estado fique pelos próximos dois anos sem pagar o serviço da dívida com o governo federal. Por certo, não seria a saída ideal. Nestes moldes, afinal, uma perda concentrada em poucos meses seria quitada em um horizonte bem mais largo. Mas talvez seja a possível.
Nota-se ao menos disposição para chegar a um bom termo nas negociações nas quais tomam parte Estados, União, Congresso e Supremo Tribunal Federal (STF). O desejável é chegar a um acordo logo, para existir maior previsibilidade em relação aos compromissos dos governadores com salários, custeio da máquina e garantia de recursos para os serviços básicos destinados à população. O problema atual causado pela desoneração repentina, no entanto, não surpreende. Foram vários os alertas no ano passado de que a caridade com o chapéu alheio que desrespeitava o pacto federativo, movida por interesses eleitoreiros, na busca por baixar a inflação na marra, teria consequências ruins. Fica outra vez a lição de que a irresponsabilidade e o populismo, mais cedo ou mais tarde, cobram a conta.