Não há justificativa moral para deputados federais reeleitos receberem da Câmara um salário extra de R$ 39.293,32 a título de auxílio-mudança. Parlamentares com mandato renovado pelo eleitor, obviamente, já estão devidamente instalados em Brasília. Inexiste, portanto, argumento que possa tornar essa sinecura aceitável.
Mesmo tratando-se de algo legal, previsto em decreto legislativo, é uma zombaria com os contribuintes
A repórter de GZH Samantha Klein procurou por mais de uma semana os 22 deputados gaúchos reeleitos para a legislatura que agora se inicia, e o resultado da sondagem não é nada animador. A intenção era saber quem ficaria com os recursos e quem devolveria. Doze sequer responderam, um comportamento que já não é o ideal. Somente três, Marcel van Hattem (Novo), Heitor Schuch (PSB) e Ubiratan Sanderson (PL), informaram que estornarão o dinheiro. Outros três disseram que decidiram repassar a verba a entidades sociais, uma parlamentar avisou que a decisão sobre o destino do dinheiro será do partido e mais três afirmaram que vão ficar com o auxílio-mudança. Os detalhes podem ser conferidos na página 8 desta edição.
Em respeito a seus eleitores e pelo dever da transparência, os deputados que se esquivaram até agora de dar uma posição deveriam informar a sociedade sobre a sua decisão. Mesmo tratando-se de algo legal, previsto em decreto legislativo, é uma zombaria com os contribuintes que, ao fim, são os financiadores dessa regalia despropositada. Esse é mais um exemplo de benesse que ajuda a macular a imagem do Congresso brasileiro, ainda mais em um período de escassos recursos orçamentários para atender a população em serviços essenciais. Não se trata tanto do montante envolvido, mas da sinalização passada aos cidadãos, que veem parte de seus representantes não se importar em ser beneficiada com um pagamento claramente indevido.
Um estudo das universidades norte-americanas de Iowa e do sul da Califórnia e da brasileira UnB mostrou que o Brasil tem, em termos absolutos, o segundo Congresso mais caro do mundo. Fica apenas atrás dos Estados Unidos, a nação mais rica do planeta. É o resultado de uma série de regalias, penduricalhos e direitos como o de ter um grande número de assessores, entre outras vantagens, somadas por décadas a fio. Há poucas semanas, o presidente da Câmara, Arthur Lira, em busca da reeleição, não se fez de rogado e, com um canetaço, dobrou o valor do auxílio-moradia para os seus pares, que passou para R$ 8.401.
Há iniciativas dentro da própria Câmara para tentar disciplinar a questão e reverter o pagamento esdrúxulo a deputados com mandato renovado. Se um dos papéis dos parlamentares é zelar pelo emprego correto dos recursos públicos, deveria se esperar que existisse amplo apoio na Casa para acabar com essa excrescência.