A Argentina é um dos principais mercados externos dos produtos de maior valor agregado da indústria do país e do Rio Grande do Sul. Diante da escassez de dólares no país vizinho, outra vez atravessando turbulências financeiras, vai no sentido correto o anúncio feito na segunda-feira pelo governo Lula de garantir crédito para importadores argentinos adquirirem itens fabricados do lado de cá da fronteira.
É preciso avançar em medidas que reduzam a burocracia e aumentem a convergência regulatória, incentivando os negócios entre Brasil e Argentina
Trata-se de uma iniciativa com efeitos de curto prazo voltada a tentar elevar as exportações, assegurando garantias reais para as fábricas brasileiras, lastreadas em ativos como commodities agrícolas, reduzindo assim o risco de calote. É uma forma de o país não perder espaço nos negócios com o principal parceiro comercial da América do Sul, com grande importância também para a indústria gaúcha. No ano passado, o Estado embarcou para a Argentina mercadorias no valor de cerca de US$ 1,3 bilhão do total de US$ 15,3 bilhões exportados pelo Brasil.
O anúncio da medida foi feito durante encontro em Buenos Aires entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o mandatário argentino, Alberto Fernández, com representantes dos dois governos firmando ainda a disposição de uma série de outros acordos bilaterais. Brasil e Argentina têm laços históricos, culturais e econômicos robustos. Independentemente dos chefes de governo de ocasião, é preciso avançar na facilitação do comércio, com medidas que reduzam a burocracia e aumentem a convergência regulatória, incentivando negócios.
Deve-se, no entanto, ter cautela com a proposta de criação de uma moeda comum entre as duas nações para transações financeiras e comerciais, outro assunto tratado no encontro. A ideia não é nova, mas como recém serão iniciados os estudos mais profundos dos dois lados acerca do tema, é preciso esperar para, no futuro, conhecer melhor os detalhes e realizar uma avaliação mais precisa da proposta. Há entre economistas opiniões diversas, mas em regra prevalece certo ceticismo quanto à viabilidade em função da assimetria dos fundamentos financeiros entre Brasil e Argentina.
Outro ponto tratado na viagem à Argentina que desperta preocupações é a possibilidade confirmada por Lula de o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) financiar um gasoduto que poderia chegar a Uruguaiana, na fronteira com o país lindeiro. É uma intenção que não traz boas lembranças. Nos governos anteriores do PT, projetos de custear obras tocadas por empreiteiras nacionais em países governados por lideranças com afinidade ideológica com a esquerda brasileira tiveram como desfecho calote e denúncias de corrupção. Resistente a autocríticas, Lula não explicou quais seriam as diferenças com os episódios antecedentes que não acabaram bem. Os erros do passado deveriam servir de lição.