Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Imagine uma economia composta de duas pessoas, apenas. Não existe dinheiro. Esta economia funciona apenas com base na troca de bens que estas pessoas possuem na largada. A partir daí, de acordo com seus interesses pessoais, elas podem fazer trocas entre si. Os preços, neste caso, são representados pela própria relação de preferência das pessoas pelos bens, estabelecendo taxas de troca – uma pessoa pode exigir duas fatias de pizza em troca de um refrigerante, digamos.
Estas trocas acontecerão até que ambas fiquem satisfeitas. Quando isso acontecer, dizemos que a economia está em um "equilíbrio eficiente". Isso significa que não há mais possibilidade de troca que seja mutuamente vantajosa – para um ficar em situação melhor, outro deve ficar pior, isto é, ceder bens sem nada em troca. Como não é razoável que alguém escolha, deliberadamente, ficar em situação pior, a economia se estabiliza.
O ponto de estabilidade, ou seja, a quantidade de cada produto que a dupla terá depois das trocas realizadas depende, além das próprias preferências, de quanto produto elas tinham no início. Alguém com poucos produtos na largada jamais terminará com muitos, uma vez que tem pouco a oferecer na troca. São as chamadas condições iniciais.
Esse é um artifício didático que utilizamos na economia para debater o conflito entre eficiência e igualdade. Uma alocação de recursos eficiente, obtida via livre mercado, não necessariamente é igualitária. Ser eficiente, neste contexto, é deixar as interações de mercado levarem à melhor alocação possível a partir das preferências das pessoas e o que elas têm a oferecer.
Se consideramos que alto nível de desigualdade é um problema na nossa sociedade, e entendemos que precisa ser corrigido, existem duas alternativas: redistribuir recursos a partir da situação vigente ou atuar na alteração das condições iniciais e permitir que um novo equilíbrio, agora mais igualitário, possa acontecer.
Políticas econômicas e de outras áreas, de modo integrado, podem atuar nestes dois flancos simultaneamente: alguma redistribuição direta e, de modo mais intenso, em reorganizar as condições inicias das pessoas. Te convido, então, a analisar o que temos hoje em termos de políticas econômica, educacional, de proteção social e de saúde, a partir desta perspectiva. É possível vislumbrar alguma redução de desigualdade, presente ou futura?