Por Pedro Dutra Fonseca, professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
A expressiva aprovação pela Câmara da reforma da Previdência deve-se a vários motivos, todavia um foi pouco explorado: a concentração dos debates na idade mínima. Esta virou verdadeiro fetiche e, paradoxalmente, ajudou na tramitação.
Em primeiro lugar, porque o país usou e abusou do bônus demográfico (período em que a taxa de crescimento da população jovem é maior do que a mais velha), aprovando regras para aposentadoria na faixa dos 40 ou 50 anos, sem precedentes nem nas sociais-democracias mais avançadas. Não há argumentos para a defesa. O objetivo no Brasil é se aposentar cedo para conseguir outro emprego, algo até compreensível para os baixos salários, mas não para a classe média.
O que remete ao segundo motivo: pouco se discutiram outros aspectos da reforma, como o cálculo dos benefícios. Assim, enquanto a “negociação” centrava-se na idade, novas regras foram adicionadas para compensar o que era cedido, como a elevação de alíquotas e a mudança de cálculo, que passa a ser 60% da média dos salários de contribuição. Detalhe: essa será calculada com base na vida toda (antes eram as 80% mais altas), o que significa que será rebaixada por dois motivos: geralmente os salários são menores no início da vida profissional e, num país com tendência inflacionária, quanto maior a inflação, menor será tal média. Para se ter uma ideia: há 30 anos, em julho de 1989, o salário mínimo era NCz$ 149,80. Entre as medidas estatísticas de tendência central, a média aritmética é que mais se deixa influenciar por valores extremos, ou seja, quanto mais se crescer na carreira, maior será o choque na hora da aposentadoria. E com mais um redutor: essa média só será alcançada após 40 anos de contribuição, pois valerá de início apenas 60% dela.
Um cálculo é sempre mais complexo para entender do que a simples idade mínima. Se racional fosse, a discussão seria entre a escolha por trabalhar mais tempo com benefício maior ao se aposentar ou o contrário. Mas nesta era em que predominam o emocionalismo e o radicalismo, como exigir racionalidade justamente em tema que mexe no bolso?