Por Igor Oliveira, consultor empresarial
Lendo uma entrevista de Ai Weiwei a Hans Ulrich Obrist, em 2006, veio à tona uma reflexão que seguidamente me ocorre. O que seria da obra e do movimento do qual Weiwei faz parte se não fosse a perseguição política sofrida por ele? O que seria da criatividade e da inovação na China se não fosse a necessidade dos chineses escaparem da vigilância estatal?
Não foram poucas as vezes em que conversei com chineses que relataram suas peripécias para acessar serviços digitais proibidos. Alguns são parte de uma geração que cresceu com essa necessidade e que, hoje, navega no oligopólio digital com mais esperteza que seus pares de outras nacionalidades. Driblam as ferramentas e as retóricas. Antecipam as ações de governos e corporações.
Fico matutando se não seria mesmo papel dos governos, principalmente dos governos nacionais, manter certo nível de hipocrisia. Usar o aparato estatal para combater a mudança até que ela se torne inevitável. Talvez a hipocrisia seja inerente a todo tipo de organização, inclusive as com finalidade pública. Em um mundo onde a informação circula cada vez mais rápido, as inconsistências ficam mais expostas do que nunca. E está tudo bem, pois é desse conflito que nascem as novidades sociais, culturais e políticas.
Talvez a linha a não ser cruzada seja a da cooptação de criativos e inovadores. É inevitável que programas estatais nesses dois campos limitem o caráter regenerativo que normalmente observamos naquela transformação genuína, que nasce na sociedade. Um exemplo brasileiro é o tropicalismo. Fruto, entre outras coisas, da repressão. Uma linguagem criada 50 anos atrás que se mantém como uma fonte importantíssima de significação e compreensão do Brasil.
Ao mesmo tempo, é inevitável que governos de grandes nações, como o Brasil, envolvam-se em agendas de cultura e tecnologia. Se não o fizerem, outras nações vão ganhar o jogo do comércio e da dominação. Aí está um paradoxo de difícil resolução. Um equilíbrio que precisa ser atingido entre Estado e sociedade.
