Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
O profissional médico é um trabalhador. Como tal, para cada ocupação, dadas suas especificidades, encontrará um padrão de remuneração. A combinação entre nível de formação necessário, especialização, habilidades individuais e tamanho do mercado de trabalho, ou seja, concorrência entre os profissionais, resulta em determinado nível de salário.
A profissão médica está entre aquelas com maior remuneração no Brasil, além de também ter uma das maiores médias de horas de trabalho semanal. Dois sinais econômicos claros de mercado de trabalho ainda carente de profissionais. Associado a isso, existe grande desigualdade na distribuição dos médicos, que estão concentrados nas capitais e polos regionais.
E é nesta realidade que o Programa Mais Médicos se insere. Cerca de 18 mil profissionais atendem regiões onde o mercado médico regular brasileiro não dá conta. O programa surgiu justamente por causa disso. Em algumas regiões do Nordeste, por exemplo, o Mais Médicos chega a responder por 80% dos profissionais.
A saída de Cuba do programa, portanto, é desastrosa. O mercado de trabalho médico no Brasil já deu muitos sinais de que tem sérias limitações para cobrir essa lacuna de 8,5 mil médicos que será aberta. O país tem dificuldade em fixar médicos no interior, especialmente nas regiões mais carentes.
Os motivos para isto envolvem questões como falta de recursos para desempenhar a função, condições de vida nestas regiões e o salário. A escolha do profissional é absolutamente racional: ele escolhe trabalhar onde estes três itens encontram um balanço que ele julga adequado. E esse balanço é mediado pelo mercado de trabalho.
Mas e o novo edital de 8 mil vagas para o Mais Médicos? Teremos adesão suficiente? Os indícios, hoje, sugerem que não. Então, restaria atuar no mercado de trabalho. Que salário temos que oferecer para um profissional se deslocar até o interior do Piauí e morar lá? Quantos médicos precisamos ter no Brasil para que a concorrência determine um salário que uma prefeitura possa pagar? Qual deve ser o conjunto de incentivos neste mercado de trabalho para que ir ao interior seja uma opção efetiva?
Precisamos de respostas na mesma velocidade que o Mais Médicos foi fragilizado. Se o problema foi um regime de “escravidão” dos profissionais cubanos ou sua qualificação, eu suponho que um mercado com boa concorrência resolva.