No enfadonho e desinteressante debate polarizado que se estabelece hoje no Brasil, falar de luta de classes virou xingamento e, não raro, piada. De um lado, um grupo fala que isso é coisa de comunista, que não existe, que é um argumento colegial. Do outro, a luta de classes é vista como o coração da política, o tradicional "proletário contra capitalista". Como em quase toda polarização, um debate estéril e equivocado.
Acontece que não há nada mais moderno que a ideia de classes. E isso é verdade, porque o seu conceito parte do pressuposto da livre associação de pessoas. O ser humano, ainda que na sua individualidade, é um ser gregário, ou seja, prefere viver em sociedade e em grupos. E, logicamente, prefere viver entre pessoas com as quais se identifica.
A ideia de classe não fere em nada os princípios liberais de que o indivíduo importa, que cada pessoa deve ser respeitada nas suas crenças, escolhas e méritos. São justamente estes indivíduos que se associam em grupos por terem crenças e valores semelhantes. Se assim não fosse, um "partido liberal" seria uma contradição em termos. E estes grupos, naturalmente, defendem tudo aquilo em que acreditam. Não há ideologia neste conceito!
O que não se vê hoje no mundo democrático é a caricata luta de classes que envolveria greves gerais dos trabalhadores para reivindicar o poder dos donos das fábricas que exploram seu trabalho. Isso, de fato, não existe mais, pois a complexidade da sociedade, suas instituições democráticas e o avanço da importância das iniciativas individuais mudaram completamente este cenário.
Agora, interesses comuns a grupos de pessoas permanecem e são defendidos como tal, como interesses de uma classe. Não me refiro aqui ao pejorativo "nós contra eles", mas à existência do conflito de interesses. E isso é natural, moderno e nada tem a ver com liberalismo ou comunismo. Sociedades simplesmente funcionam assim.
Por exemplo: quando a reforma trabalhista estava em debate, empresários se uniram para defendê-la. Um dos argumentos dos empresários era que os sindicatos não contribuíam para uma relação saudável entre empregado e empregador, e eles deveriam ser enfraquecidos. A reforma foi aprovada. Hoje, vejo grupos de empresários defendendo o fortalecimento dos sindicatos patronais. Tudo é uma questão de associação e interesses comuns. E classe, queira ou não, é um nome para isso.