Não se sabe como começou, mas as tulipas, importadas de Constantinopla, viraram moda na Europa. Os preços dispararam e ostentá-las representava status. As raras valiam mais. Passou-se a negociá-las na bolsa de Amsterdã. Vendiam-se joias para comprar tulipas. Um dia, talvez por aumento da oferta ou simples enfado por se tornarem corriqueiras, o preço desabou. A década de 1630 registra a considerada primeira crise especulativa da história. Já no século 20, o mafioso Ponzi captava recursos prometendo juros altíssimos, os quais honrava com novos empréstimos. Tal qual as tulipas, o "esquema Ponzi" era insustentável. Como nas "correntes de felicidade" que às vezes circulam, só os primeiros ganham.
Por isso, quando as bolsas sobem muito, o conselho é ter cautela. O Ibovespa bate recorde a cada semana: valorizou-se 25%, em dólar, em 2017. E não só aqui: Dow Jones, Nasdaq e o Bloomberg (que mede as bolsas de 96 países) apresentaram desempenhos surpreendentes, este último de 64% em dólar. É claro que há certo otimismo com relação ao desempenho das economias dos EUA e da China, e mesmo a Europa dá sinal de vida, com o susto do Brexit já internalizado. Mas nada que justifique tanta euforia. Ocorre que os juros baixos nesses países, anos a fio, incentivaram o crédito e o endividamento e, com isso, a "sensação" de riqueza e o preço dos ativos. A liquidez mundial e o endividamento das famílias nos EUA são hoje superiores aos de 2007, ano em que a atual "bolha" de tulipas arrebentou.
Já o bitcoin, a mais famosa criptomoeda, completou sete anos e nesse período valorizou-se 880 mil vezes. Símbolo da pós-modernidade financeira, ao contrário das bolsas, dispensa Estado, regulamentação, lastro e qualquer materialidade. Nasceu para facilitar transações pela internet (inclusive as ilegais), mas virou um ativo e não está isento da pirâmide de Ponzi, em que os primeiros a entrar levarão a melhor. Autoridades monetárias de vários países têm alertado, mas quem segura uma aplicação que rende 1000% ao ano? A moderna economia comportamental postula que os aplicadores nem sempre são racionais e que a aversão a perdas supera a preferência por ganhos. Todos sabem que o "crash" virá, a questão é: quando? O problema não é querer ganhar, a irracionalidade está em desconhecer os limites.