*Professor titular do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFRGS
Diz-se que se alguém deve muito o problema não é dele, mas do credor. Pois o aforismo certamente não se aplica à dívida do RS com a União. O "regime de recuperação fiscal" impõe ao Estado medidas extremas, as quais vão degradar ainda mais a qualidade dos serviços públicos, inclusive educação, saúde e segurança.
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Claro que não se espera que a burocracia federal, cônscia de suas responsabilidades, estimule rompimento de contratos ou precedentes que incitem o endividamento em cadeia de outros Estados – até porque a União também está mal das pernas. Mas se o RS tem de cumprir sua parte, também não se podem exigir cláusulas como as sobre os vencidos de guerra, quando não há a mínima preocupação com as consequências. Paradoxalmente, talvez se a dívida fosse com bancos privados houvesse maior chance de negociação.
Pior: a carência do pagamento por três anos representa uma folga para os atuais dirigentes, mas joga o ajuste para o futuro. Pode nos aguardar uma festa de gastos de fim de governo. Mais importante seria condicionar qualquer dinheiro novo ao abate da própria dívida, a fim de sinalizar um futuro melhor. Ao contrário, a previsão é de que o passivo aumente cerca de R$ 11 bilhões. E nada se prevê com relação às isenções de impostos e subsídios: "bolsas-empresário" locais são tratadas como segredo de estado.
Outra questão nevrálgica é o indexador. Dependendo de qual taxa de juros servirá para a rolagem da dívida, o efeito a torna, como já está, impagável. Juros compostos capitalizados em períodos longos de tempo, como se sabe, trazem-nos as mais amargas surpresas da matemática, causa de falências, suicídios e até revoluções. Estados devedores, para a União, viraram bom negócio.
Estranha ainda o fato de o Rio de Janeiro ter conseguido condições vantajosas e em tempo recorde, o que se atribui ao dedo político do trio Temer-Rodrigo Maia-Moreira Franco. Se é verdade, deve ter caído a pose dos técnicos inflexíveis da Secretaria do Tesouro Nacional. Ocorre que a maioria de deputados e senadores gaúchos também compõe a "base aliada". Mas nem isso consegue. Dizem que o apoio é por convicção e não por pragmatismo. Vendo-se quem ocupa a maior parte dos ministérios, quem é o chefe e as denúncias dos últimos tempos, é difícil saber qual das alternativas é ética e politicamente mais comprometedora.