* Procurador de Justiça aposentado, jornalista, diretor do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre
Foi em Uruguaiana. O rapaz caminhava pela rua quando deparou com aquela conta de energia elétrica no chão, enroladinha, contendo o dinheiro para seu pagamento. Não teve dúvidas: foi ao banco, pagou e tratou de localizar seu titular. Tinha até um troquinho que queria devolver.
A notícia ganhou destaque. Não é todo o dia que se veem demonstrações de correção e honestidade como as daquele jovem.
Vivemos tempos em que atos triviais da vida de relação ganham notoriedade. Assim mesmo, sou capaz de apostar que a maioria dos brasileiros dotada de um mínimo de senso de urbanidade e educação, faria o mesmo. Nego-me a crer que tenhamos perdido todos os referenciais de respeito ao semelhante, indispensáveis à vida social e que estejamos sempre à espreita de uma oportunidade de produzir danos a outrem, em proveito próprio.
Sigo convencido de que a enxurrada de atos de corrupção que parecem espelhar a personalidade de nossa gente não é mais que um desvio provisório e episódico de uma caminhada no rumo da civilização. A produção de bens materiais que, desde a Revolução Industrial, mudou a face do mundo, criando, a cada instante, necessidades novas, fez da ganância o móvel central da vida. Inoculou na alma humana o veneno de um materialismo ignóbil. Fez com que se perdesse o sentido da vida.
Não é, como dizem alguns, a ausência e religião ou de crenças. É a carência de um sentido para a vida. Quando dela se retira o valor de solidariedade e de justiça, intrínsecos a qualquer forma de convivência, joga-se o ser humano num vazio existencial que o aproxima do caos. Mas o caos não é o destino do ser humano, seja qual for o patamar em que se encontre a sociedade onde vive.
Aparentemente, perdemos as mais primárias noções do sentido da vida. Mas, com certeza, as resgataremos. Até porque já está dando para ver que a conta a ser paga por esse provisório desvio de rumo é insustentavelmente pesada.
Como o rapaz de Uruguaiana, a maioria dos brasileiros sabe muito bem disso.