A falta de correlação direta entre remuneração elevada dos professores e o desempenho do ensino evidenciada na rede municipal de Porto Alegre, levantada em reportagem na edição desta sexta-feira de ZH, é uma questão preocupante que precisa ser levada em conta por toda a comunidade. Por diferentes razões, a começar pela pressão de corporações fortes e administrações demagógicas, a Capital transformou-se em laboratório de políticas educacionais, no qual condições favoráveis, incluindo boas escolas e dispêndios elevados por aluno, não se mostram suficientes para assegurar um ensino de qualidade minimamente aceitável. A continuar assim, aprofundaremos as desigualdades e a perda de relevância educacional da Capital.
O mais recente e mais contundente argumento contrário à tese de que uma boa remuneração bastaria, por passe de mágica, para reverter o quadro do ensino é apontado por levantamento divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). Mesmo com as ressalvas feitas por representantes de entidades do magistério, o trabalho deixa evidente que os professores da rede de ensino de Porto Alegre são, de longe, os com melhor remuneração entre as capitais, com base em dados de 2014. Ainda assim, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2015, os alunos da Capital ficaram entre os com pior desempenho do país.
Relatório divulgado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), quase simultaneamente ao estudo do Inep, demonstra que, entre 2008 e 2015, Porto Alegre foi a Capital que mais gastou por aluno. O contraste entre a elevada remuneração dos professores municipais em Porto Alegre e o fraco desempenho dos alunos reafirma que boas condições se diluem na falta de gestão e de comprometimento para identificar os reais problemas do ensino e trabalhar para corrigi-los. Essa deficiência ajuda a explicar tendências, como a de mais ênfase ao aspecto da titulação, em detrimento de cursos adequados de formação e avaliações permanentes, que costumam gerar melhores resultados.
Pagar bem professores é obrigação de qualquer sociedade civilizada, mas está claro que é preciso ir muito além. É preciso implantar a meritocracia e valorizar os melhores professores. É preciso cobrar resultados, formá-los melhor e de modo contínuo, restabelecendo o respeito a valores básicos e à sua autoridade em sala de aula.
Representantes da comunidade escolar, sindicatos inclusive, precisam fazer uma autocrítica, para deixar no passado os discursos simplistas e demagógicos. Se não se aceitar que há um problema gravíssimo com o ensino na Capital, vamos desperdiçar muito mais do que tempo e recursos valiosos: vamos condenar gerações de crianças e adolescentes a um futuro aprisionado pela baixa qualidade da educação.