Uma pesquisa observou mudanças na relação entre tutores e gatos domésticos após a pandemia de Covid-19. A médica veterinária Maíra Ingrit Gestrich-Frank, 30 anos, investigou o tema em sua dissertação de mestrado em Biologia Animal pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
O estudo foi realizado no primeiro semestre de 2023 e analisou três períodos diferentes: pré-pandemia, confinamento e pós-confinamento. Intitulada "O impacto do confinamento e do convívio social no bem-estar e comportamento dos gatos domésticos (Felis catus)", a tese pode ser lida aqui.
— A tese surgiu no contexto de como o período da pandemia afetou a rotina e o comportamento dos gatos — afirma Maíra, que tem sete felinos e vive em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos.
O estudo investigou como a mudança de rotina, com os tutores ficando mais tempo com os gatos durante a Covid e posteriormente retornando ao período anterior ao confinamento, impactou no comportamento felino.
O questionário de 31 perguntas foi distribuído majoritariamente de forma online para tutores de gatos espalhados pelo Brasil maiores de 18 anos. O tutor precisava fornecer dados para os três momentos avaliados. Um total de 1.064 pessoas participou do levantamento. Segundo a análise, o escore ambiental dos animais melhorou.
— Temos diretrizes para um ambiente felino saudável publicado pela Associação Americana de Práticas Felinas. Trata-se de cinco pilares (veja abaixo quais são), que são estratégias que aplicamos na residência para promover o bem-estar dos gatos — explica a pesquisadora em relação ao que seria o escore ambiental.
Cinco pilares
- Um local seguro (como poleiros, áreas de esconderijo ou acesso a espaços ao ar livre)
- Acesso seguro a recursos-chave (vasilhas e fontes de água, locais para alimentação, lazer, descanso, caixas de areia e superfícies para arranhar), que devem ser fornecidos em locais e quantidade adequados, conforme o número de gatos no mesmo domicílio
- Oportunidades de brincadeiras que simulem a caça e promovam a sequência de comportamentos predatórios naturais
- Interações sociais positivas para o gato, consistentes e previsíveis com os humanos
- Ambiente que respeite a importância dos cinco sentidos do gato, em especial o olfativo e o uso da comunicação olfativa através da marcação por feromônios
O escore ambiental investigava se os tutores ofereciam esses recursos aos gatos, se brincavam com os pets, se faziam escovação, davam carinho, promoviam passeios, entre outras situações. E as conclusões foram as seguintes:
— Em relação ao ambiente, observamos que houve uma melhora. Após o confinamento, os tutores proporcionaram mais recursos (como brinquedos e arranhadores) e uma rotina mais saudável de interação.
Segundo a pesquisa, um comportamento em especial destacou-se durante o confinamento – maior busca e atenção dos tutores.
— Os gatos realmente ficaram mais carentes e carinhosos. Também ficaram mais calmos e relaxados, principalmente aqueles que ficaram mais tempo com os tutores.
O escore ambiental avaliou ainda a condição corporal dos gatos. O levantamento observou que durante e após a pandemia os felinos ganharam mais peso na comparação com o período anterior à pandemia de covid.
— Aqueles gatos que tinham livre acesso ao meio externo e realizavam mais atividades apresentavam uma menor chance de ganho de peso.
Agitação, miados e correrias
O estudo também identificou alguns comportamentos negativos. O principal foi a agitação, com registros de miados excessivos e correrias pela casa.
— Isso pode estar associado ao fato de que os gatos se comunicam com as pessoas através de vocalização. Os tutores ficando mais tempo com os gatos durante o confinamento, os animais acabaram solicitando mais a atenção até como forma de pedir comida — detalha, acrescentando:
— Também tivemos um aumento de eliminação de urina e fezes em local inapropriado, e o de lambeduras. E alguns problemas relacionados a vômitos, diarreias, constipação e alterações no apetite, que também aumentaram na pandemia e após esse período na comparação com a pré-pandemia.
Atualmente, Maíra estuda Psicologia na UFRGS, trabalha com comportamento felino e pretende dedicar-se à relação entre tutores e animais.
Adestradora orienta como identificar problemas nos gatos
A médica veterinária comportamental e adestradora positiva de gatos e cães, Caroline Pezzi, 42, salienta que os gatos não costumam dar sinais de quando estão doentes. Para saber se o animal está feliz, a profissional enumera cinco sinais e situações:
- Gatos precisam ter acesso a água limpa e fresca, preferencialmente a uma fonte de água corrente e não apenas parada, e ao pote de ração
- Devem ter um ambiente confortável, com as condições climáticas boas, livre de frio ou calor excessivo. O local precisa ser adequado para descanso
- Em casos de dor ou doença, o gato pode ficar mais escondido e apresentar mudanças no apetite. Também pode não usar a caixa de areia diariamente e começar a fazer as necessidade fora do local
- O felino precisa expressar os comportamentos naturais, como arranhar, ter locais altos para descansar e se sentir seguro
- O gato necessita ter o local para fazer as necessidades em um ponto mais tranquilo e retirado. É preciso cuidar para que crianças não manipulem excessivamente o felino
Segundo a adestradora, que atua desde 2011 nessa função com os pets, qualquer mudança de comportamento repentina pode indicar um problema.
— Se é um gato que participa muito da rotina da família e de uma hora para a outra começa a se retirar, esse animal pode estar com uma questão clínica. Ou se o gato vive escondido, e mudou o comportamento de forma geral, pode ser que ele não esteja bem. Isso acontece muito quando uma pessoa vai introduzir um novo gato no ambiente.