Milhares de gaúchos sentem hoje o peso da incerteza, da dor e da destruição. Eles estavam no caminho de águas e ventos que arrastaram vidas, casas e sonhos.
Uma casa é muito mais que tijolos e telhas. É a segurança, o álbum de família, o filho correndo pelo pátio, os meses de trabalho para pagar sofá e fogão. A maioria desses mais de 11 mil gaúchos que olham para o futuro e nada enxergam não lerá jornal ou navegará pela internet hoje. Mas é para eles que escrevemos.
Por mais que amarguem a sensação de que perderam tudo, ela passará. O Rio Grande do Sul é um Estado solidário. Ao mesmo tempo em que rios transbordavam e temporais se formavam, uma corrente do bem começou a se encadear. As estruturas oficiais têm agido de forma satisfatória. Mas são os gestos anônimos que dão a medida exata da força gigantesca das comunidades, nessa hora, por mais paradoxal que pareça, fortalecidas pelo objetivo comum de ajudar.
Lonas, comida, medicamentos são necessários. Mas é fundamental lembrar do imaterial, do que o coração sente sem precisar ver: um abraço, um carinho, uma visita, uma palavra de conforto. A reconstrução só acontece do lado de fora quando começa dentro de cada um, dos que sofrem e dos que se importam.
Os prognósticos apontam para a chegada de mais frio. Como se não bastasse tudo o que já foi imposto. Muita gente saiu de casa apenas com a roupa do corpo. No fim de semana todos dispomos, certamente, de 15 minutos para vasculhar armários em busca do que não usamos mais. Ou meia hora para comprar uma peça que gostaríamos de usar e oferecê-la a alguém que sequer conhecemos.
Deixemos para depois os dedos em riste, as disputas políticas, os julgamentos, os ódios, o apego doentio ao poder. Tudo isso pode e deve esperar. O Rio Grande do Sul sabe encontrar nele mesmo os remédios que levam a um amanhã mais luminoso. É hora de aproveitar essa indesejada chance para exercitar a capacidade que mantemos intacta, embora muitas vezes submersa nas águas turvas da intolerância, de olharmos na mesma direção.