Esta semana, conversava com alguns colegas professores sobre recursos mais eruditos para tratar de temas centrais da economia nas disciplinas que lecionamos. Acabamos falando de um filme de 1940, dirigido por John Ford, chamado As Vinhas da Ira, baseado em livro homônimo de John Steinbeck. Sugeri este filme para uma aula sobre a Grande Depressão.
Aclamado como um clássico do cinema, o filme retrata as agruras enfrentadas por uma família rural de Oklahoma, EUA, em busca de trabalho na época da crise. Guiados pelo filho mais velho, Tom, eles vagam em um caminhão paupérrimo e abarrotado, rumo à Califórnia, onde havia a promessa de melhores condições de vida.
Neste filme, aparecem alguns elementos fundamentais para compreensão do período em questão: o mercado de trabalho, a posse de terra e máquinas, a posse de capital monetário, movimentos sociais e também transformações das posições políticas e ideológicas – especialmente através do personagem Tom. Este, com o passar do tempo, se dá conta da gravidade da situação enfrentada ao vislumbrar a ameaça real a sua dignidade e da sua família.
É neste ponto que reside o brilhantismo do filme: tratar de um evento histórico tão marcante pelas suas causas e consequências econômicas, através da percepção sensível dos cidadãos. Estas pessoas que estão migrando, não estão buscando trabalho e moradia fixa apenas para pagar contas. Elas buscam aquilo de mais valioso que emprego e moradia representam: dignidade.
O pai da família, em uma das cenas mais comoventes, ignorando os aspectos econômicos da jornada que estão travando, apenas lamenta o fato de que nunca mais veria sua casa original. Essa é representação mais cruel de um ambiente de crise: quando aquilo que faz a pessoa sentir-se parte do organismo social lhe é tirado. E só nos damos conta disso quando abrimos os olhos para algo além do número frio.
No Brasil de hoje, estamos passando ao largo de uma compreensão humana mais ampla sobre os efeitos da crise. Absortos em um péssimo ambiente político, associado a todos os demais problemas objetivos que bem conhecemos, parece que estamos ficando cegos para o mais elementar: as pessoas. Como sociedade, não olhamos além do número. E também temos dificuldade em olhar para além do próprio umbigo.