Se o extermínio de criminosos tivesse o poder dissuasório que seus defensores imaginam, o Brasil já estaria apto a ingressar num período de redução da criminalidade. Mas não é bem assim. As mortes nos presídios brasileiros já eram rotineiras por doenças, uso de drogas e brigas esporádicas entre os detentos. Agora, ganharam escala de guerra civil. Não passa dia sem que ocorra uma chacina no interior de alguma penitenciária do país, principalmente devido à guerra do tráfico entre facções criminosas, mas também por motivos que as autoridades nem sequer conseguem entender e explicar.É uma ilusão imaginar efeito positivo na eliminação de delinquentes quando se constata a crueldade de seus carrascos. Muitos dos criminosos mortos nos recentes motins foram degolados, decapitados e tiveram seus corações arrancados dos corpos, numa selvageria pré-histórica. Os autores de tais atrocidades não podem ser vistos como justiceiros, pois também eles são homicidas e psicopatas, que não hesitarão em utilizar os mesmos métodos contra qualquer cidadão quando tiverem oportunidade. Basta lembrar que alguns criminosos de alta periculosidade, inclusive, fugiram da cadeia durante os motins marcados pela barbárie.
Mais do que isso: os primeiros levantamentos sobre os mortos identificados na penitenciária de Manaus indicam que a maioria responde pelo crime de roubo, apenas um percentual menor é de homicidas e estupradores. O tribunal do extermínio, como em todo julgamento emocional e sumário, não faz distinções. Mas ninguém pode ter dúvida sobre a malignidade dos exterminadores.
Quando se defendem condições dignas para os delinquentes sob a tutela do Estado, não são eles que se quer proteger. É a sociedade. Ao transformá-los em feras ensandecidas, o sistema judiciário e prisional eleva a insegurança da população, pois cedo ou tarde, por cumprimento de pena ou por fuga, esses indivíduos que decapitam e arrancam corações estarão livres para agir também fora da prisão.
O Brasil precisa, sim, de presídios seguros. Mas precisa, muito mais, de políticas públicas que combatam e previnam a criminalidade.
Editorial
Feras ensandecidas
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