No início dos anos 70, o general Emílio Garrastazu Médici, então presidente imposto da República, estava em uma visita a Porto Alegre, em um evento de churrasco e cerveja, quando questionou os presentes sobre a falta de homenagens ao falecido general e presidente Castelo Branco. Naquele tempo, auge da ditadura militar, poucos se atreveriam a contestar o ditador, e, se houvesse alguém, por certo não seria um dos convidados da confraternização.
Imediatamente sugeriram que a avenida de ligação de Porto Alegre com a freeway tivesse o nome de Castelo Branco. Ocorreu, ali, um curioso processo de denominação de logradouro sem qualquer projeto de lei, posto que jamais a Câmara Municipal apreciou a "sugestão" que virou ordem e, por incrível que pareça, foi imposta e aceita na capital dos gaúchos, logo passando a constar nos mapas oficiais da cidade. Foi uma vergonha.
Em 2014, no cinquentenário do golpe militar de 1964, o país inteiro buscou desmonumentalizar e modificar a denominação de logradouros, praças e avenidas, que homenageassem os símbolos do período em que as prisões arbitrárias, as cassações, os exílios, a tortura e a morte foram prática do regime então vigente, e que era a própria ditadura militar. Foi neste contexto, portanto, que eu e a vereadora Fernanda Melchionna apresentamos um projeto para mudar o nome da avenida que homenageava o ditador para Avenida da Legalidade e da Democracia, o que nos propiciava um justo reconhecimento ao maior movimento cívico da história nacional, que foi a Legalidade, comandada pelo governador Leonel Brizola a partir de Porto Alegre.
A lei número 11.688/2014, assim, é o resultado de todo um esforço nacional de ressignificação de espaços públicos, na busca da verdade e da justiça, o que somente uma memória bem construída pode fazer. Em cinco mandatos que tive de vereador em Porto Alegre, este foi o único nome de rua que dei, e do qual tenho o maior orgulho. Acho estranho, agora, que alguns saudosistas do período discricionário busquem descaracterizar a importância e o resultado da ação legislativa que tive, sendo bom relembrar que, desta vez, a denominação da avenida foi um projeto legal completo, com iniciativa e deliberação por votos, bem diferente da ordem ditatorial que havia criado o primeiro nome.