Não é fácil enfrentar tema tão inquietante, em momento tão próximo dos atos praticados em Capão da Canoa pelo impiedoso estuprador de uma garotinha de cinco anos de idade. Não haveria outra ocasião para rever e repercutir os lúcidos e instigantes argumentos dos professores Jorge Trindade e Ricardo Breier, coautores de obra insuperável sobre a matéria.
Com eles aprendi que não se pode tratar a pedofilia separando Direito e Psicologia. Sobram aspectos penais, mas são abundantes as razões que nos levam a examinar temas psíquicos ao interpretarmos e julgarmos um criminoso pedófilo. Sou contra a pena de morte e a prisão perpétua. Jamais admitiria um linchamento ou qualquer vindita. Sei que milhares de pessoas, nesses casos, tornam-se adeptas da Lei de Talião, querendo pronta resposta, na mesma ou em medida ainda maior que a da tragédia cometida pelo delinquente. Entendo-as.
Para Freud, a pedofilia é a perversão dos fracos e impotentes, sexualmente inibidos, razão de escolherem pessoas vulneráveis como parceiras. A condição tão frágil das vítimas é a causa do clamor social. Qual a resposta justa a cometimento tão abusivo e destruidor? Temos mecanismos legais suficientes e eficazes para reprimir e prevenir esses crimes hediondos?
Resolve-se o dilema pela condenação a uma pena de prisão, admitida a progressão de regime e outros benefícios que devolverão o criminoso às ruas? Ainda que se imagine o condenado em um ambiente deletério como a cadeia, isso impedirá que ele ou outros cometam os mesmos crimes outras vezes?
A resposta é dispensável. Só existirá a hipótese da reincidência, só contaremos com o recrudescimento dessa criminalidade voltada a destruir as crianças atingidas, não raras vezes em seus ambientes familiares.
Necessário que se examine, sempre, o caso concreto. Definido por avaliação psiquiátrica o autor do crime como portador de pedofilia, desconsidere-se a aplicação de uma pena, mas se lhe aplique medida de segurança, consistente em internação em instituto psiquiátrico, por um prazo mínimo de dois anos, durante o qual será paciente de tratamento. Ao fim do período, o pedófilo será submetido a exame de verificação de suas condições. Enquanto perdurarem as que o conduziram à segregação, ficará recolhido, submetendo-se a exames periódicos, mesmo que isso represente ainda mais tempo que uma restrição decorrente de condenação a um tipo penal. O Tribunal de Justiça gaúcho tem reconhecido a substituição da pena por medida de segurança em casos de réus submetidos à avaliação psiquiátrica cuja conclusão foi de que eram portadores de pedofilia, que, apenas reclusos, mas sem tratamento, voltariam certamente a cometer os mesmos abusos. A medida de segurança é o meio adequado de prevenção e repressão.