Um fantasma percorre os círculos acadêmicos na Europa e nos Estados Unidos: a possibilidade de que o planeta esteja enfrentando uma crise internacional como a da década de 1930, que culminou em uma conflagração mundial, devido ao presidente Donald Trump.
A chegada de Trump ao poder e suas primeiras medidas internacionais, com pressão máxima sobre a Ucrânia para que negocie a paz com a Rússia, que invadiu o país vizinho em 2022, provocaram os primeiros sinais de alerta, segundo alguns analistas.
"Mais uma vez olhamos para os anos 30 porque foi um momento importante em que as democracias foram testadas e falharam em impedir a ditadura. E a ideia é que poderiam ter evitado a Segunda Guerra Mundial se tivessem formado uma frente unida contra Hitler", declarou à AFP John Connelly, historiador da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos.
Outros historiadores aceitam que Trump é um presidente nacionalista ao extremo, com seu lema "America First" ("Estados Unidos em primeiro lugar"), suas tarifas e medidas populistas, como renomear o Golfo do México, conhecido com esta nomenclatura há vários séculos, para Golfo da América.
Mas "a esquerda trivializa o totalitarismo real", opina o historiador conservador americano Daniel J. Mahoney.
Quando Trump organizou um comício no Madison Square Garden de Nova York, em outubro de 2024, os democratas o acusaram de ter repetido um ato de campanha similar dos simpatizantes nazistas nos Estados Unidos em 1939, no mesmo local.
Mas Trump venceu as eleições com a maior aliança de eleitores brancos, hispânicos, afro-americanos e asiáticos registrada em décadas para um candidato republicano, recorda o historiador.
- A vingança de Nixon? -
"Há muitas coisas que recordam os anos 30, muitas caixas idênticas que estão marcadas na decomposição da política, na fragilidade de certas conquistas, o direito internacional pisoteado e no uso desinibido da força, da brutalidade contra seus aliados", destaca Tal Bruttmann, historiador especializado no Holocausto.
Entrevistado pelo jornal New York Times, o célebre historiador americano Robert Paxton, habitualmente relutante em usar um qualificativo "que gera mais barulho que clareza", reconsiderou sua posição antes mesmo da vitória eleitoral de Donald Trump em novembro.
"Está fervendo de maneiras muito preocupantes e é muito semelhante aos fascismos originais", disse Paxton no final de outubro.
Mas outros historiadores, como o britânico Niall Ferguson, destacam uma contradição: se Trump encarna o fascismo, não se pode, ao mesmo tempo, considerá-lo o fantasma do primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, que em 1938 forçou a Tchecoslováquia a aceitar a cessão de seu território dos Sudetos à voraz Alemanha nazista.
Um visitante assíduo da Ucrânia antes do início da guerra, Ferguson critica a postura de negociação de Trump, mas considera que o abrasivo presidente é mais uma reencarnação do também presidente republicano Richard Nixon, que modificou o tabuleiro internacional nos anos 1970 ao negociar o fim da guerra no Vietnã e se aproximar da China para enfraquecer a União Soviética.
"Parabéns, Donald Trump: você é oficialmente a vingança de Richard Nixon", escreveu recentemente no New York Post.
Para o vice-presidente americano JD Vance, é a Europa, berço dos totalitarismos de esquerda e direita, que enfrenta um "inimigo interno".
A expressão, que Vance utilizou na conferência de segurança de Munique em fevereiro, provocou uma grande polêmica na Europa.
"A ameaça que mais me preocupa a respeito da Europa não é a Rússia, não é a China, não é nenhum outro agente externo. O que me preocupa é a ameaça interna. O retrocesso da Europa em alguns de seus valores mais fundamentais: valores compartilhados com os Estados Unidos da América", afirmou Vance, em referência à liberdade de expressão, entre outros temas.
* AFP