O pedreiro Maoro viveu quase quatro décadas no Colorado sem problemas, mas nesse último mês tem evitado de sair de casa, temendo que as autoridades de imigração o detivessem e o deportassem por não ter documentos para residir nos Estados Unidos.
"É pior que uma prisão", disse à AFP, em sua casa, na cidade de Aurora, foco da retórica anti-migração de Donald Trump durante sua campanha presidencial no ano passado.
"Já me sinto mal por não poder sair para trabalhar", acrescentou este homem de 59 anos, que não tem conseguido pagar o aluguel e agora depende da filha, que é cidadã americana.
Maoro assegura que nunca teve tanto medo como agora, vivendo sob uma administração republicana, que prometeu deportações em massa de imigrantes sem documentos de moradia nos Estados Unidos.
Quando três homens uniformizados bateram em sua porta recentemente, o mexicano - que se identificou à AFP com um pseudônimo, como outros entrevistados -, seguiu os conselhos dos ativistas pró-imigração e não abriu a porte para eles.
Seu medo é um sentimento compartilhado em Aurora, o subúrbio de Denver onde vivem pessoas de centenas nacionalidades diferentes, de acordo com organizações não governamentais.
Igrejas e mesquitas foram esvaziadas, assim como os pontos da cidade onde os diaristas esperavam por ofertas de trabalho. Um shopping, repleto de restaurantes latinos, disse que em fevereiro havia menos de 10 mil clientes, em comparação com anos anteriores.
Oficiais do Serviço de Controle de Imigração e Alfândega, fortemente armados, realizaram operações em Denver e Aurora em 5 de fevereiro, e prenderam várias pessoas.
- "Operação Aurora" -
A cidade de Aurora entrou no debate nacional sobre imigração no ano passado, quando viralizaram vídeos que mostravam homens armados, que falavam espanhol, invadindo um apartamento.
Trump, então candidato à presidência, usou os vídeos para dizer que a gangue venezuelana Tren de Aragua havia "assumido o controle" de Aurora.
Mas o prefeito republicano, desmentiu a versão, e disse que o vídeo era apenas um incidente isolado, ocorrido em um prédio privado administrado por um proprietário negligente.
Ao mesmo tempo, o Departamento de Polícia de Aurora, disse ter registrado uma queda no índice de criminalidade entre 2023 e 2024, em comparação com os dois anos anteriores.
No entanto, Trump insistiu em afirmar que Aurora era o símbolo dos Estados Unidos sob ataque de perigosos imigrantes criminosos, e assegurou que, se eleito, deportaria milhões.
Os imigrantes em Aurora afirmam que foram usados como bodes expiatórios para problemas sociais existentes.
"Tudo o que há de errado nos Estados Unidos agora, tudo, é Tren de Aragua", ironizou Alexander Jiménez, um venezuelano que fugiu do seu país há um ano. "Não pode ser".
Jiménez limita suas saídas e permanece escondido junto com dez membros de sua família, todos aguardando que seus pedidos de asilo sejam processados.
Desde os ataques, sues netos se recusam a ir à escola por medo de que a polícia venha e leve seus pais embora.
"Eles veem na televisão o que está acontecendo, que estão tirando os venezuelanos e a todos os que não são daqui, deste país", disse, acrescentando que nas operações de fevereiro foram mortas pessoas sem antecedentes criminais.
Naquele momento, uma publicação nas redes sociais afirmava que "mais de cem membros da violenta gangue venezuelana Tren de Aragua são alvo de prisão em Aurora, Colorado, hoje pelo ICE".
De acordo com a televisão Fox News, das trinta pessoas presas, somente uma estava afiliada à gangue.
Contactadas pela AFP, as autoridades se negaram a dar detalhes sobre os detidos.
"A busca por criminosos do ICE é usada como pretexto para prender pessoas inocentes, sem antecedentes criminais", disse Nayda Benítez, da Coalização pelos direitos dos imigrantes do Colorado.
Sua organização oferece assessoria aos migrantes sobre os seus direitos legais, em espanhol, árabe e inglês. Eles explicam que não precisam abrir a porta se a polícia não tiver um mandado de busca, que podem permanecer em silêncio e que não tenham que assinar nada.
Esses conselhos são muito valiosos para Susana, uma mexicana sem documentos, que foi deportada em 2017, durante o primeiro governo de Trump, e que passou cinco anos separada dos filhos até poder retornar ao Colorado.
"Quando você descobre que tem direito, é algo forte, porque você diz 'se eu soubesse antes'", comentou a mulher de 47 anos, que lamenta ter "falado muito" quando foi interceptada pelas autoridades da última vez.
"Eu sabia que havia uma Constituição", suspira. "Mas eu não sabia que aquela Constituição me protegia como migrante".
* AFP