Quando inspetores decidiram, meses atrás, que a envelhecida ponte sobre o canal Kiel, no norte do país, estava fraca demais para o tráfego de caminhões pesados, Holger Dechant ficou confuso, pois fora contratado para entregar turbinas eólicas gigantes do outro lado.
Por fim, ele criou uma rota alternativa e reveladora do estado lamentável de algumas das estradas e pontes da Alemanha. A empresa vai levar as turbinas para uma balsa, despachá-las para a Dinamarca, ao norte, e depois remetê-las novamente para o sul, de volta à Alemanha.
- A coisa está feia assim. Nós não investimos o suficiente. E agora temos problemas porque não existe um botão fácil para consertar tudo - , disse Dechant recentemente ao explicar em seu escritório o desvio de quase 300 quilômetros.
A Alemanha já foi conhecida pelas autobahns (rodovias) supervelozes, indústria eficiente e capacidade de reunir recursos públicos para grandes projetos, como a integração com a antiga Alemanha Oriental. Porém, ultimamente, o país se viu forçado a enfrentar um problema atípico: sua infraestrutura - estradas, pontes, trilhos de trem, hidrovias - está envelhecendo de tal forma que pode enfraquecer o crescimento econômico durante anos.
Enquanto pregava a austeridade aos vizinhos, a Alemanha manteve na rédea curta os próprios gastos em casa. Agora os críticos externos (incluindo a União Europeia e os Estados Unidos) a estão pressionando a fazer mais para estimular a própria economia. Os prováveis parceiros da chanceler Angela Merkel em uma nova coalizão governamental, o Partido Social Democrata, de tendência esquerdista, estão buscando mais dinheiro para um série de programas.
De acordo com especialistas, um bom lugar para começar a injetar dinheiro é no suporte físico da nação. Uma comissão designada pelo governo concluiu recentemente que seria necessário gastar 7,2 bilhões anuais durante 15 anos - praticamente 70% a mais do que é gasto agora - para deixar a infraestrutura existente em boa forma. Para outros peritos, ainda mais dinheiro é necessário para escolas, por exemplo, e para levar cabos de fibras ópticas a áreas de menor população.
- Se não gastarmos, então a Alemanha ficará para trás e as próximas fábricas não serão construídas aqui - , disse Kurt Bodewig, chefe da comissão governamental.
Um relatório anterior do Instituto Alemão para Pesquisa Econômica foi ainda mais severo em sua avaliação, dizendo que outros países da União Europeia estavam fazendo muito mais para garantir seu futuro. - Chegou a hora de a Alemanha atacar sua falta de investimento - , assegurava o estudo.
Não está claro de onde o dinheiro pode vir, principalmente em função da aversão dos conservadores de Merkel a impostos elevados. O superávit orçamentário de US$ 270 milhões projetado para o ano que vem, mesmo que entregue inteiramente as estradas e pontes, não seria o suficiente para atingir o valor que a comissão governamental disse ser necessário, e existem várias outras questões competindo por financiamento. Uma solução seria o pedágio para rodovias. Os parceiros conservadores de Merkel na Baviera insistem nesse tributo, que poderia ser alinhado à redução de taxas existentes para motoristas e empresas domésticas, mas que afetam milhões de estrangeiros e empresas cruzando a Alemanha.
Críticos temem que, mesmo se dinheiro adicional começar a entrar em breve, talvez não chegue a tempo de evitar problemas importantes, que estão começando a surgir. Um ano atrás, inspetores encontraram rachaduras nos suportes de aço de uma importante ponte rodoviária nos arredores de Colônia, a quarta maior cidade da Alemanha. As autoridades forçaram desvios para outras quatro pontes que agora vão precisar de US$ 202 milhões em obras. Os desvios afetaram empresas locais e complica o trânsito durante quilômetros todo dia.
Quase imediatamente, empresas da região começaram a pressionar a Federação Alemã da Indústria a fazer alguma coisa. Pressionando por gastos adicionais de pelo menos US$ 5,4 bilhões anuais em manutenção, a entidade calculou que o fechamento parcial da ponte custa à indústria local de 60 milhões a 80 milhões de euros durante um período de três meses.
Autoridades regionais temem que a infraestrutura envelhecida da área levará indústrias a se mudar para outro lugar ou tornará seus produtos menos competitivos. Por exemplo, Dechant disse que o trajeto pela Dinamarca custou 50 por cento a mais do que uma entrega sobre a ponte Kiel.
- Pode levar 20 anos para construir uma nova ponte. E nós não sabemos se as pontes atuais conseguem durar tanto tempo - , afirmou Michael Groschek, ministro dos transportes da Renânia do Norte-Vestfália, estado que engloba Colônia e inclui dezenas de pontes construídas 50 ou 60 anos atrás, quando a carga média dos caminhões era menor.
Entre 1991 e 2012, a Alemanha reduziu o orçamento para manutenção em 20%, segundo Gernot Sieg, especialista em transportes e professor da Universidade de Münster. O governo agora gasta 1,5% do produto interno bruto em manutenção - a média europeia é de 2,5 por cento. Aproximadamente 46 por cento das pontes alemãs, 41 de suas ruas e 20 por cento das rodovias necessitam de reparos, assegurou Sieg.
As estradas ao redor das cidades alemãs vivem congestionadas. Os trens lotados geralmente estão atrasados. No verão passado, um trecho de concreto de uma rodovia envergou com o calor, matando um motociclista e ferindo quatro pessoas. Ainda existem aparelhos de mudança de via férrea que precisam ser operados manualmente. O sistema hidroviário da Alemanha depende de eclusas antiquadas, em funcionamento há mais de um século, tornando-as suscetíveis a quebras e, em geral, pequenas para os barcos modernos.
A Alemanha entrou em um surto de construção quando os lados Ocidental e Oriental se reuniram em 1990. A maioria dos gastos foi direcionada à Oriental, em extrema necessidade de modernização. Segundo os especialistas, o problema é que a Ocidental recebeu pouquíssima atenção, mesmo que antigos moradores do lado Oriental tenham se mudado para o Ocidental em busca de empregos. Em um curto período de tempo, estradas e pontes na Ocidental começaram a receber uma pressão para a qual não foram construídas. Segundo as autoridades, a ponte com rachaduras nos arredores de Colônia foi construída para suportar 35 mil veículos por dia, mas agora aguenta 120 mil.
Em seu relatório, o Instituto Alemão atacou não apenas a falta de manutenção de estradas, pontes, ferrovias e hidrovias, mas também a falta de investimentos públicos em escolas, creches e o fracasso em criar incentivos para o investimento privado nos setores de energia e telecomunicações.
De acordo com especialistas, a Alemanha está ficando para trás até mesmo na rede de fibra óptica de alta velocidade, sendo superada por países como Bulgária, Lituânia e Romênia. Autoridades de cidades pequenas ficaram tão cansadas de esperar que começaram a agir sozinhas para instalar cabos de fibra óptica, com cada morador colaborando com mil euros por cabeça.
- Por exemplo, nós temos uma usina de aço interessada em se mudar para outra comunidade onde a internet é melhor. Nós vimos que algo tinha de ser feito e rápido - , afirmou Holger Jensen, prefeito de Lowenstedt, vilarejo de 650 habitantes nos arredores da fronteira dinamarquesa.
Embora essas questões certamente sejam mencionadas nas reuniões do novo governo de coalizão, nem todos estão convencidos de que mudanças sérias estão chegando.
- É tudo uma questão de dinheiro. Sem ele, todos esses relatórios não passam de listas para o Papai Noel - , afirmou Groschek.
Falta de investimento
Problemas de infraestrutura podem enfraquecer o crescimento econômico da Alemanha
Críticos acreditam que a falta de investimentos do governo alemão em alguns setores estruturais podem deixar o país para trás
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