Entre os acusados de homicídio culposo pela morte de seis pacientes do Hospital Lauro Reus, de Campo Bom, estão Jorge Ricardo Fischer Pigatto, diretor-executivo da Associação Beneficente São Miguel (ABSM), e Melissa Fuhrmeister Cândido, que era diretora administrativa da casa de saúde.
A ABSM administrava o Lauro Reus quando ocorreram as mortes por falta de oxigênio, em março de 2021. O Grupo de Investigação da RBS (GDI) teve acesso à íntegra da denúncia do Ministério Público contra nove pessoas.
Além de Pigatto e Melissa, também foram enquadrados na acusação por homicídio culposo quatro pessoas que atuavam no setor de manutenção do hospital — Diordinis Maciel de Mello, Jeferson Oliveira Miranda, Paulo Ricardo Machado Lopes e Douglas Pereira Gomes — e três funcionários da fornecedora de oxigênio, a Air Liquide Brasil: Marcelo Sauner Junior, Bruno Elias de Souza e Cleber Belote de Lima.
Oito dos nove denunciados já haviam sido indiciados na investigação da Polícia Civil. O MP incluiu Cleber, analista logístico da Air Liquide. Em relação a duas pessoas que a polícia havia indiciado por falso testemunho, o MP pediu o arquivamento do procedimento em relação a eles.
A denúncia, feita na terça-feira (13), descreve que nos dias que antecederam o evento o hospital vinha tendo alta de consumo de oxigênio. Também que a administração havia demitido o único funcionário que sabia manipular o tanque e os cilindros de oxigênio, tendo contratado e colocado a trabalhar funcionários sem o treinamento adequado.
O MP apontou que o hospital tinha Plano de Operação Padrão e que a norma previa que, em caso de baixo nível de oxigênio, a chefia de enfermagem e diretores deveriam ser avisados, o que não teria ocorrido. Apesar de o baixo nível ter sido detectado um dia antes do fato, não houve esse aviso.
Foi feito, no entanto, pedido de reabastecimento, mas a Air Liquide teria informado que só faria a reposição no final da manhã do dia 19, apesar de os dados de telemetria indicarem níveis críticos de oxigênio já na tarde do dia 18 de março.
A denúncia
Às 7h25min do dia 19, alarmes soaram e as equipes foram surpreendidas com a falta de oxigênio. A ausência do gás durou 28 minutos, conforme perícias. Naquele momento, conforme a denúncia, havia 20 pacientes entubados e 30 com máscaras de oxigênio.
Em um trecho, a denúncia registra que "a administração do hospital era sabedora do alto consumo de oxigênio verificado nos dias que antecederam o evento, era sabedora da ausência de medidas para garantir o reabastecimento do oxigênio, da ausência de medidas que resultassem em ações prévias para evitar ou minimizar a falta de oxigênio aos pacientes".
A Associação Beneficente São Miguel, que fazia a gestão do Lauro Reus, foi tirada da administração no mês passado.
Também consta da denúncia que outras mortes ocorridas depois do dia 19 foram apuradas em outros inquéritos policiais e as apurações ainda dependem de diligências solicitadas pelo MP. Em julho, um inquérito foi concluído pela Delegacia de Campo Bom apontando que outras 15 pessoas morreram horas ou dias depois em decorrência da interrupção de oxigênio ocorrida em 19 de março.
A denúncia do MP de Campo Bom agora será analisada pela Justiça.
Contrapontos
O que dizem:
Jorge Ricardo Fischer Pigatto, diretor-executivo da Associação Beneficente São Miguel —O GDI deixou recado no telefone celular e com a presidência da ABSM, mas não obteve retorno.
Melissa Fuhrmeister Cândido, ex-diretora administrativa/financeira do Lauro Reus —
O GDI tenta contato por telefone.
Diordinis Maciel de Mello, auxiliar no setor de manutenção do hospital à época —
O GDI fez contato com a defesa dele, mas não obteve retorno.
Paulo Ricardo Machado Lopes, engenheiro e coordenador do setor de manutenção do hospital à época — "Não tenho conhecimento da denúncia e não vou me manifestar, por enquanto."
Douglas Pereira Gomes, coordenador do setor de manutenção à época — O GDI tenta contato.
Jeferson Oliveira Miranda, técnico em engenharia química, atuando no setor de manutenção à época — o GDI tenta contato.
A empresa Air Liquide, que teve denunciados os funcionários Marcelo Sauner Junior, representante comercial, Bruno Elias de Souza, programador dos reabastecimentos, e Cleber Belote de Lima, analista logístico — "Em 13 de setembro de 2022, a Air Liquide Brasil tomou conhecimento de que três de seus funcionários foram denunciados pelo Ministério Público, em relação ao incidente ocorrido no Hospital Lauro Reus em 19 de março de 2021, juntamente com outros seis réus externos à empresa. A Air Liquide está monitorando de perto o assunto e continuará colaborando com as autoridades em todas as etapas do processo. A Air Liquide não comenta o mérito dos processos judiciais pendentes. A Air Liquide está totalmente comprometida com a segurança e o bem-estar de seus funcionários, clientes e comunidades em que opera."