A Justiça Federal acatou em parte o pedido do Estado e determinou que os repasses de recursos à Associação Beneficente Silvio Scopel (ABSS), gestora do Hospital Bom Jesus (HBJ), em Taquara, sejam bloqueados e depositados em conta judicial. Com a decisão, a ABSS não receberá mais as remessas mensais de recursos públicos, os quais ficarão sob guarda judicial para quitação posterior de dívidas trabalhistas e outras pendências da gestão da ABSS. A retenção dos valores deve ser aplicada a partir dos pagamentos de janeiro de 2020.
O juiz Nórton Luís Benites, da 1ª Vara Federal de Novo Hamburgo, ainda prorrogou de forma "derradeira" a permanência da Silvio Scopel na administração do hospital até 31 de março, "no intuito de evitar a descontinuidade dos serviços de saúde". O magistrado determinou que, até o prazo limite, a prefeitura de Taquara, o Estado e o Ministério Público Federal (MPF) deverão promover uma conciliação de esforços para que um novo gestor seja definitivamente contratado.
No despacho, o juiz classificou a administração do HBJ como "preocupante" e listou 17 "evidências indicativas de irregularidades na gestão conduzida pela ABSS".
A decisão judicial foi assinada eletronicamente pelo juiz às 21h30min da última sexta-feira, 28 de fevereiro, dia em que reportagem do Grupo de Investigação da RBS (GDI) revelou problemas na gestão da ABSS em Taquara e em outros quatro municípios gaúchos.
No mesmo despacho, a Justiça Federal acatou um pedido do MPF e determinou que o Estado deve fazer depósitos de R$ 4,2 milhões em juízo para resguardar possíveis dívidas da ABSS na administração do HBJ. Os saldos dessas pendências foram apresentados pela própria Silvio Scopel. Por determinação do magistrado, deverão ser prioritários os pagamentos de R$ 430,7 mil em verbas trabalhistas, R$ 101,2 mil em parcelas atrasadas de FGTS e
R$ 2,8 milhões de inadimplência da associação com prestadores de serviços e fornecedores de produtos.
A Justiça Federal autorizou o Estado a depositar R$ 920,6 mil como valor de reserva para o futuro administrador do hospital. Não foi especificado se o aporte total de R$ 4,2 milhões deve ser feito parceladamente ou apenas em uma vez pelo governo estadual. A Secretaria da Saúde respondeu que está ciente da decisão e que analisa juridicamente os termos do despacho quanto aos depósitos em juízo, sendo que uma "conclusão deve ocorrer em breve".
O HBJ é referência na região de Taquara, considerado um equipamento de saúde de médio porte, com estrutura de UTI, oncologia e cem leitos hospitalares.
O CASO
A ABSS assumiu a administração do Hospital Bom Jesus, em Taquara, em dezembro de 2017, designada como interventora pela 1ª Vara Federal da Justiça de Novo Hamburgo. A associação foi chamada para substituir outra instituição que presta serviços terceirizados na área da saúde, o Instituto de Saúde e Educação Vida (ISEV), o qual foi afastado judicialmente sob argumento de má gestão.
Mensalmente, a ABSS recebia R$ 1,8 milhão em repasses da União, do Estado e do município para fazer a gestão do hospital. Apesar de os pagamentos estarem em dia, a Silvio Scopel atrasa salários de médicos desde agosto de 2019, em alguns casos. Também há dívidas com fornecedores e a Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) está fechada desde dezembro por recomendação da Vigilância Sanitária. A Secretaria da Saúde diz que a ABSS "descumpre metas" de atendimento ao público e pratica "má gestão".
Contraponto
A reportagem entrou em contato na segunda-feira (02) com o então superintendente-geral da ABSS, Piraju Nicola Neto, e com a assessoria de imprensa da entidade. Neto respondeu na terça-feira (03) à noite, informando seu afastamento da ABSS e da gestão do hospital de Taquara. Já a assessoria da ABSS voltou a ser contatada na terça-feira, com novo pedido de manifestação sobre o bloqueio de verbas, mas a entidade não se manifestou.
O que diz Piraju Nicola Neto: "Informo que solicitei meu afastamento da diretoria-executiva da Associação Beneficente Silvio Scopel (ABSS) a partir de matéria jornalística levantando suspeição sobre a gestão em unidade de saúde gerenciada pela ABSS. Tomei essa decisão há mais dias no único e elevado intuito para que tais fatos sejam esclarecidos com imparcialidade, distanciamento e transparência, certo de que a verdade prevalecerá".