A tramitação de primeira instância do processo contra os 14 acusados de terem praticado desvios de recursos na gestão do Inter, entre 2015 e 2016, deverá se estender por até dois anos na 17ª Vara Criminal de Porto Alegre. A estimativa é do advogado Flávio Lia Pires, especialista em matéria criminal.
— Antes disso, me parece difícil, mesmo que haja um tratamento preferencial, já que todos os passos formais precisam ser seguidos — diz Lia Pires, destacando a importância de obedecer ritos legais para evitar eventuais alegações de nulidade.
A denúncia do Ministério Público foi fatiada em duas: uma do núcleo de obras e outra do de futebol, com oito e seis acusados, respectivamente. Nesta quinta-feira (7), um dia após promotores de Justiça terem apresentado acusação publicamente, as peças estavam no cartório da 17ª Vara Criminal para autuação e inclusão de dados no sistema eletrônico. Nos próximos dias, o juiz Marcos La Porta da Silva receberá o processo para uma análise inicial em que irá verificar se os aspectos formais da denúncia estão corretos. Depois disso, o magistrado decide se aceita a denúncia, transformando os acusados em réus, ou se opta pelo arquivamento imediato por falta de elementos. Esse é o passo inaugural.
Se a decisão for pela continuidade, o processo é instalado e o juiz determina a citação dos réus para que eles apresentem, dentro de um prazo pré-estabelecido, a defesa preliminar por escrito. Também poderão, neste momento, indicar as suas testemunhas.
— Como são vários fatos narrados pela acusação, acredito que poderão ser mais de dez testemunhas por réu — avalia Lia Pires.
Testemunhas
Na sequência, o juiz marca as audiências para colher a prova oral. Falam primeiro os arrolados pela acusação. Depois, os indicados pela defesa. Se todos os 14 acusados se tornarem réus e se valerem do uso máximo de testemunhas, é provável que o caso ultrapasse uma centena de pessoas a serem ouvidas.
Costuma ser uma fase demorada, já que todas as testemunhas precisam ser intimadas antes de prestar depoimento. São recorrentes as ocasiões em que oficiais de Justiça tentam e não conseguem fazer as intimações porque as pessoas não são localizadas. Ainda nesta etapa, podem ser requeridas perícias contábeis ou técnicas em documentos e obras supostamente realizadas que fazem parte da acusação contra os ex-gestores do Inter.
Vencida a fase da prova oral e de eventuais perícias, abre-se a etapa final do processo e o magistrado dá prazo para que MP e réus apresentem as alegações finais. É a chance derradeira das partes para convencer o juiz dos seus argumentos. Depois disso, a sentença já pode ser emitida.
Da decisão, caberá recurso ao Tribunal de Justiça (TJ). Lia Pires estima que esse estágio somente deverá ser alcançado em três ou quatro anos.
O que diz o juiz
Titular dos dois casos, Marcos La Porta da Silva explicou, em nota, que não fará declarações fora dos autos.
"Prefiro não me manifestar publicamente sobre os dois processos, mesmo que seja somente sobre o andamento, para evitar qualquer alegação, ainda que de má-interpretação, de violação ao disposto no artigo 36 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman)", justificou o magistrado, citando norma que os impede de opinar, em meios de comunicação, sobre processo pendente de julgamento.
As possíveis punições previstas em lei aos ex-dirigentes do Inter denunciados
Vitorio Piffero*
Estelionato (reclusão de um a cinco anos e multa) e organização criminosa (três a oito anos e multa)
Pedro Affatato**
Estelionato (reclusão de um a cinco anos e multa), organização criminosa (três a oito anos e multa), falsidade ideológica (um a três anos e multa em caso de documento particular) e lavagem de dinheiro (três a dez anos e multa)
Emídio Marques Ferreira**
Estelionato (reclusão de um a cinco anos e multa), falsidade ideológica (um a três anos e multa em caso de documento particular), lavagem de dinheiro (três a dez anos e multa) e organização criminosa (três a oito anos e multa)
Carlos Pellegrini**
Estelionato (reclusão de um a cinco anos e multa) e lavagem de dinheiro (três a dez anos e multa)
*O MP ainda pediu que haja uma majoração da pena pelo suposto exercício de comando da organização. Esse cálculo, se acatado judicialmente, é feito pelo juiz na sentença.
**O MP aponta que os crimes foram praticados de forma continuada. Se isso for acatado em sentença, o juízo deverá calcular a majoração da pena devido à reiteração dos atos.