
A demora em compreender a extensão da crise gerada a partir das manifestações de caminhoneiros em todo o país dificultou as negociações que poderiam por fim aos atos. Parte da população, simpática às bandeiras apresentadas – como a redução do preço dos combustíveis – passou a apoiar o movimento. Outros temas, como o combate à corrupção, trouxeram ainda mais desgaste à classe política. Em meio ao impasse, surgiram grupos de apoiadores de uma intervenção militar.
A seguir, uma análise das perdas e ganhos a agentes públicos e instituições.
Michel Temer

Entre analistas, é recorrente a ideia de que ninguém perdeu mais com as manifestações do que o presidente Michel Temer. A demora em apresentar ações para atenuar os efeitos da paralisação e a negociação com lideranças não reconhecidas por segmentos de caminhoneiros prolongaram o impasse, amplificado pela falta de abastecimento de combustíveis e alimentos.
Apesar de prejudicada, parte da população se uniu à categoria, legitimando suas reivindicações. O avanço do movimento fez com que Temer cedesse em diversos pontos considerados, até então, fora da discussão pela equipe econômica. Um deles foi o desconto na alíquota do PIS/Cofins. A fonte para cobrir o rombo causado pela frustração de receita foi indicada somente quatro dias após o anúncio e incluiu cortes de programas sociais nas áreas da saúde e educação, entre outros setores.
— Quando as consequências aparecerem, vai dar reação forte da população — opina David Fleischer, cientista político da UnB.
Integrantes da base aliada engrossam o coro das ruas e da oposição com críticas públicas às medidas adotadas pelo Planalto, que acabou cedendo em mais um quesito. A saída do presidente da Petrobras, Pedro Parente, era bandeira frequente em discursos na Câmara e no Senado.
A fragilidade do governo – com consequentes abalos à política partidária do país – levou grupos de caminhoneiros a pedir intervenção militar, situação desestimulada pelas próprias Forças Armadas.
Jair Bolsonaro
O deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) recebeu críticas por seus posicionamentos conflitantes frente às paralisações. No primeiro dia dos atos, foi o primeiro pré-candidato à presidência a manifestar apoio. Mas, no quinto dia, quando a dificuldade em encontrar combustível e produtos nas gôndolas de supermercados foi acentuada, criticou os bloqueios nas rodovias, responsabilizando partidos e movimentos de esquerda.
Ele é autor de um projeto de lei que prevê prisão para quem obstruiu vias públicas. Apesar disso, defendeu a revogação de multas e outras sanções a quem impedisse a movimentação de caminhões por um "futuro presidente honesto/patriota".
— Ele demonstrou uma posição camaleônica. É contra protestos, mas cria relação de empatia com a base dos caminhoneiros — destaca o cientista político e professor da Unisinos, Bruno Lima Rocha.
Apesar de defender o período da ditadura militar no país, declarou não apoiar a intervenção militar pedida por grupos de caminhoneiros.
Ciro Gomes/PT/Esquerda
Apesar de se posicionarem tradicionalmente no front de manifestações de trabalhadores, os partidos de esquerda não tiveram protagonismo desta vez. Representantes de PT, PC do B e PSOL engrossaram o coro pela demissão de Parente, mas não foram responsáveis diretamente pelos bloqueios.
O PT tentou liderar uma greve de 72 horas dos petroleiros, ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), mas a intervenção do Tribunal Superior do Trabalho (TST) – que estipulou multa de R$ 2 milhões por dia em caso de paralisação – frustrou o movimento.
O presidenciável Ciro Gomes (PDT) fez críticas a Parente e à política de preços da Petrobras e foi a figura da esquerda mais presente nos noticiários durante as manifestações. Para o cientista político e professor da Unisinos Bruno Lima Rocha, o discurso trabalhista do ex-governador do Ceará pode aproximá-lo dos caminhoneiros.
Rodrigo Maia/Eunício Oliveira
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também pré-candidato à presidência, foi incisivo nas críticas ao governo pela condução da busca por saídas da crise. Fiador da extinção do PIS/Cofins do diesel em projeto aprovado pelos deputados, após subestimar o impacto financeiro ao Planalto, foi criticado pela cúpula do Executivo.
A ação também desagradou o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), atrasando a análise da proposta na Casa e posterior envio para a sanção do presidente Michel Temer.
Geraldo Alckmin/Marina Silva
Como não havia líderes claros nas manifestações, nenhum político conseguiu ligar sua imagem de forma instantânea aos movimentos. Segunda colocada em pesquisas de intenção de voto, Marina Silva (Rede) comentou genericamente ao atos, afirmando em uma rede social que a "greve dos caminhoneiros é mais uma demonstração da insatisfação "de milhões de brasileiros". Geraldo Alckmin (PSDB) também usou as redes sociais para comentar os atos, mas apenas no oitavo dia, quando defendeu um "colchão tributário" para suavizar grandes mudanças de preço. Também criticou o governo pela demora em garantir um acordo com os trabalhadores.
Petrobras

O nível de abalo sofrido pela Petrobras com a crise envolvendo o governo e os caminhoneiros pode ser medido pelo mau humor do mercado após o anúncio de controle artificial do valor do diesel. A saída de Pedro Parente, responsável pela política de preços com oscilações diárias para o bolso do consumidor, trouxe incertezas, que deverão permanecer até a efetivação de um novo líder para a estatal.
— Por enquanto, a Petrobras está perdendo (com as manifestações). A recuperação vai depender da política de preços e da autonomia de um novo presidente — destaca o economista Roberto Troster.
A solução para o impasse adotada pelo governo para o preço do combustível – corte de tributos e subsídio – é criticada. Para o economista, taxar o setor produtivo e a folha salarial de empresas é desaconselhado em um momento com alto índice de desemprego. A saída passaria por aumento de tributos na área financeira.
Forças Armadas
O lado oposto da balança, em contraposição ao chefe do Executivo, é ocupado pelas Forças Armadas, que foram acionadas para a liberação de pontos de bloqueios em rodovias. A presença de militares no cotidiano das decisões do Planalto é vista como um dos principais sinais de enfraquecimento político do governo.
O Exército foi acionado por Temer para enfrentar a violência no Rio, para atuar na crise gerada com a entrada de venezuelanos em Roraima e até para dispersar manifestações contra a reforma da Previdência no ano passado em Brasília.
— Quando a governabilidade se torna insuficiente, o brasileiro chama as Forças Armadas pela ânsia de ordem — comenta Anderson Teixeira, doutor em Direito Constitucional e professor da Unisinos.
Para Teixeira, as instituições militares no Brasil gozam da simpatia de parte da população que refuta sua atuação em crimes cometidos contra opositores durante a ditadura, entre 1964 e 1985.