A corregedoria do Ministério da Fazenda pedirá a anulação de todos os julgamentos feitos pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em que houve irregularidade na atuação dos conselheiros investigados na Operação Zelotes. Quase dois anos depois de a operação revelar um esquema de pagamento de propinas no conselho, a corregedoria já pediu ao Carf a anulação de quatro processos.
O órgão informou que entrará com representação de nulidade em todos os processos nos quais houver indícios de irregularidade na atuação de conselheiros, depois de concluída a investigação. O Carf é a última instância administrativa para se recorrer de uma multa aplicada pela Receita Federal. O conselho é formado por representantes da Fazenda e dos contribuintes.
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Já foram feitas à Justiça 15 denúncias pelo Ministério Público Federal na Operação Zelotes em processos em que as autuações da Receita Federal somam pelo menos R$ 30 bilhões. A corregedoria é parte da força-tarefa da operação e a tendência é de que seja pedida nulidade nos processos já denunciados pelos procuradores, o que levaria a um novo julgamento dos casos.
Cervejaria
Apenas um dos pedidos de anulação feito pela Fazenda ao Carf foi julgado – e negado. O processo envolvia uma autuação do empresário Walter Farias, dono da Cervejaria Petrópolis, no valor de R$ 8,6 milhões, e há suspeita de pagamento de propina a conselheiros para reduzir a multa. A assessoria do empresário informou que o processo contra ele foi arquivado na Justiça Federal e continua apenas contra outras partes.
O pedido de anulação foi analisado por uma turma ordinária do Carf, que entendeu não haver ainda provas suficientes, já que não houve decisão judicial, apenas a denúncia do Ministério Público Federal. A Procuradoria da Fazenda informou que recorrerá à câmara superior do conselho, que é quem dará a última palavra.
O presidente do Carf, Carlos Alberto Barreto, disse que cada pedido será analisado de forma diferente e individual pelo órgão e que, dependendo das provas, algumas turmas poderão decidir pela nulidade e outras não. Ele espera receber pedidos de anulação em todos os processos em que as investigações foram concluídas pelo Ministério Público Federal e acredita que as denúncias vão além das 15 já apresentadas.
Barreto minimizou, porém, o impacto dos "rejulgamentos" no dia a dia do conselho.
– É um número pequeno diante da quantidade de processos que o Carf julga – ponderou.
Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cláudio Lamachia, os julgamentos do Carf devem ser anulados se houver condenação transitada em julgado, quando não cabe mais recurso.
– Um ato viciado por corrupção não pode prevalecer. Será preciso recomeçar do zero os casos onde isso for provado. Agora, a mera suspeita ou uma acusação não bastam – afirmou.
Tanto a corregedoria quanto o Carf alegam que os processos são sigilosos e não informaram em quais processos foram feitas representações para anular os julgamentos.
Bônus de eficiência
A criação de um bônus de eficiência para auditores fiscais levou a Justiça a suspender sete processos que tramitavam no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), entre eles dois da BM&FBovespa. O número de empresas buscando liminares na Justiça, porém, deve crescer nas próximas semanas.
Desde dezembro, servidores da Receita Federal passaram a receber uma gratificação que aumenta à medida que o órgão arrecadar mais. Ocorre que metade dos conselheiros do Carf são auditores fiscais, recebem o bônus e julgarão, justamente, recursos de contribuintes contra as decisões do Fisco.
As empresas recorreram à Justiça para suspender julgamentos com a alegação de que o pagamento da gratificação compromete a imparcialidade dos conselheiros do Carf, já que eles receberão mais se mantiverem as autuações da Receita em seus julgamentos. Com sete liminares concedidas, poderá haver um efeito cascata afetando uma série de processos.
– O bônus vai na contramão da tendência atual de absoluta impessoalidade e transparência. ê ruim para o País como um todo se tivermos uma indústria de multas que pune quem produz e afasta investimentos –, afirmou o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cláudio Lamachia.
A comissão tributária da ordem concluiu que o bônus é inconstitucional e o pleno da entidade analisará, em março, se entra com uma ação de inconstitucionalidade no STF. Com isso, todos os julgamentos do Carf poderão ser suspensos, o que paralisará a análise de 120 mil casos que tramitam no conselho, referentes a mais de R$ 600 bilhões em autuações da Receita Federal.
– Mais uma paralisação seria péssima para a imagem do Carf. As instituições têm que agir rápido para superar essa crise –, disse Lamachia.
O sócio-fundador do escritório Mattos Filho, Roberto Quiroga, diz que a tese jurídica em torno de tais liminares, que questionam o bônus de eficiência dos auditores fiscais, é bastante robusta.
– O tema já foi judicializado. Nosso aconselhamento tem sido de que a matéria jurídica é séria e forte –, afirmou.
O presidente do Carf, Carlos Alberto Barreto, porém, disse que os contribuintes estão pedindo a suspensão de julgamentos do órgão como "estratégia processual" para adiar as decisões.
– Pode haver mais ações, mas não acredito que essa tese vingue no Judiciário –, afirmou.