Vestida com uma camisa vermelha nova, a pequena Opelika não conseguia ficar quieta na antessala da câmara municipal da cidade do Alabama que lhe emprestou o nome. E quem poderia culpá-la? Em poucos minutos ela conheceria o prefeito. A mãe ternamente calma, Lily, ignorava sua inquietação.
Elas estavam sendo homenageadas pelos serviços prestados à comunidade e, na metade da apresentação, como acontece com os pequenos, Opelika roubou o show dos vereadores pomposos. Ela latiu.
As cadelas da raça Labrador fazem parte do Programa de Ciências do Desempenho Canino da Universidade de Auburn, no Alabama, que cria e treina cães com o intuito de utilizar seu olfato poderoso para manter a segurança das pessoas. Após um ano de preparo, Opelika provavelmente será empregada por uma agência pública ou empresa privada de segurança para detectar bombas, narcóticos ou outras ameaças.
Durante a metade desse ano, ela vai morar em uma prisão estadual, onde os prisioneiros que ganharam o direito de trabalhar no programa esbanjam tempo e atenção aos animais para refinar as táticas de detecção e reforçar a socialização. É muita coisa para um filhote como Opelika dar conta. A maioria dos cachorros passam os primeiros meses aprendendo pouco além de não roer os móveis da sala. Porém, os organizadores do programa afirmam que o sistema produz cães altamente disciplinados cujas habilidades se equiparam ou superam tecnologias de ponta.
Os cachorros, na maioria labradores (escolhidos pela sociabilidade e resistência física), saem das prisões com "maior maturidade mental", disse Jeanne Brock, chefe dos adestradores. Durante o processo, momentos espantosos de humanidade vêm à tona. Brock contou que um prisioneiro chorou.
- Eu não tocava num cachorro há 40 anos - ele lhe contou.
A poucos quilômetros dos verdes quadriláteros do principal campus da Universidade de Auburn, encontra-se o prédio de Ciências do Desempenho Canino. À exceção da pele de uma píton de quatro metros pega nos Everglades da Flórida, onde os cães de Auburn perseguiram cobras invasoras, a sala de reuniões é bastante trivial.
Durante muitos anos, os cachorros foram treinados a encontrar artefatos explosivos improvisados colocados em um estacionamento ou escondidos em uma loja. O foco mudou um pouco oito anos atrás, quando os cientistas e treinadores de Auburn foram procurados com um novo desafio: como detectar uma bomba caseira em movimento, isto é, carregada por um terrorista.
- A primeira aplicação em que pensamos foi para o trânsito - disse Paul Waggoner, um dos diretores do programa.
Cães vigiam metrôs e posses presidenciais
A ideia era preservar o fluxo das pessoas e identificar indivíduos suspeitos. Waggoner e colegas se perguntavam qual seria a maneira mais eficaz para os cães patrulharem áreas com muita gente. Eles encontraram a resposta no trabalho de Gary Settles, professor de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual da Pensilvânia cuja pesquisa mostrou que humanos produzem plumas térmicas emanadas pelos corpos e que carregam partículas gasosas. A maioria dessas partículas, como traços de transpiração ou perfume, é benigna, mas a pluma também pode indicar o contato com materiais perigosos. Então, em vez de examinar todo mundo, os cachorros poderiam inspecionar os "rastros aerodinâmicos humanos" e alertar o treinador da presença de explosivos.
- É um desafio muito maior do que se pensa - garantiu Waggoner. - Por natureza, os cães querem investigar coisas e pessoas, não o espaço aberto.
Entre os primeiros animais treinados de acordo com o novo protocolo estavam os cachorros empregados pela Amtrak (empresa de transporte ferroviário), em 2007, e até agora mais de 70 foram utilizados. Cães treinados para detectar rastros de vapor também vigiam o metrô nova-iorquino, posses presidenciais e eventos esportivos no estádio Busch, em Missouri.
Animados com os progressos caninos no rastreio de correntes de ar, os diretores do programa começaram a fazer experimentos com alvos mais enganosos. Em vídeo exibido aos visitantes, o cachorro chamado Baxter cheira os armários de uma casa vazia utilizada como centro de pesquisa, alertando quando acha um cotonete com um perigoso vírus bovino. Entre outras coisas, os pesquisadores estão interessados em saber se os cachorros podem ser utilizados para encontrar vírus que afetem o gado, na esperança de que os fazendeiros não precisem mais sacrificar os rebanhos para eliminar os poucos animais infectados.
Ambiente restrito, cães mais eficientes
Segundo a maioria das estimativas, os cães têm 40 vezes mais receptores olfativos do que os humanos - 200 milhões contra cinco milhões. Mesmo assim, o surpreendente não é os cães conseguirem detectar odores em partes de trilhão, mas também distinguir tantos cheiros.
- É como identificar uma voz no meio de uma multidão - comparou Waggoner.
Entre as pessoas que trabalham com cachorros, é amplamente sabido que o primeiro ano na vida de um animal é vital para essa formação. É quando ele aprende a socializar e fica acostumado com os sinais e sons de seu ambiente.
Originalmente, Auburn se valia de famílias locais para cuidar dos filhotes. Mas, apesar das diretrizes precisas que os voluntários recebiam para manter a aptidão física dos cães e não mimá-los, quando eram visitados os cachorros estavam no sofá, vendo televisão e comendo batata frita. Quase 80% não atingiam os padrões rigorosos de cão detector.
Sabendo que animais que trabalham foram treinados com sucesso em prisões, os diretores do programa decidiram, em 2004, colocá-los no Instituto Correcional de Bay, na Flórida. A taxa de fracasso caiu rapidamente com a mudança para um ambiente mais restrito e, agora, a universidade mantém parcerias com cinco prisões na Flórida e na Geórgia. Uma delas é a Unidade Correcional Coffee, em Nicholls, Geórgia, que abriga homens cumprindo sentenças de até 25 anos.
Alguns dos treinadores de Coffee são profissionais veteranos - um trabalhava com o décimo cachorro -, enquanto alguns são novatos no programa. Eles moram em um quarto dedicado, onde as camas dos cães ficam ao lado da dos detentos.
Ex-diretor da Coffe, Grady Perry afirmou ter um orgulho tremendo da parceria com a Auburn, dizendo que ela melhorou a moral e o comportamento dos prisioneiros:
- O índice de incidentes nessa unidade é quase inexistente.
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