Professora da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) e autora do livro A Conversação em Rede: A Comunicação Mediada pelo Computador e as Redes Sociais (Ed. Sulina, 2012), Raquel Recuero analisou, em entrevista a ZH, o tumulto ocorrido durante debate sobre combate ao ódio e à intolerância nas redes, realizado na quarta-feira em Porto Alegre.
Por que se tem a sensação que existe, nas redes sociais, um excesso de intolerância e violência?
- Acho que isso não está em todos os canais, mas em alguns, principalmente no Facebook e no Twitter. Especialmente após o ano passado, por conta, principalmente, das eleições, essas agressões adquiriram outra proporção. Isso é um efeito direto da guerrilha informacional que tomou a mídia social durante o período (das eleições). Mas não quer dizer que todo mundo seja assim. É preciso entender também que há uma articulação de grupos, e muitas vezes temos o efeito do "grito", ou seja, aparece mais quem grita mais alto, mesmo que esse grito seja dado por um grupo pequeno.
As pessoas são agressivas na internet por quais motivos?
- Primeiro, porque elas não veem a audiência, que é invisível. Elas interagem com uma tela, e com uma audiência imaginada. No "calor" da emoção, acabam falando coisas para essa audiência, que, claro, não é todo mundo. Isso gera mais agressão ainda, já que as pessoas que não foram intencionalmente agredidas se ofendem, e por aí vai. Em segundo lugar, aquilo que é dito permanece, é difícil de apagar (qualquer um pode dar print screen) e tem muito mais impacto. Em terceiro, as redes são heterogêneas, com pessoas de diferentes credos, opções e ideias. Só que na vida cotidiana, a gente normalmente não procura o conflito na conversa, mas a cooperação. Há exceções, é claro, mas de modo geral a gente conversa com as pessoas sobre o que elas concordam conosco, evitamos os assuntos mais "espinhosos". Na internet, tu não consegues fazer isso. Não tens como separar as audiências. Além disso, existem os "trolls" e os "haters", que são grupos organizados para implicar, fazer barulho e criar confusão online, não apenas na seara política, mas em qualquer uma. E esses grupos conseguem se articular bem na internet, porque a rede proporciona isso.
Veja no vídeo o momento do coro de protesto:
Sua pesquisa sobre violência nas redes sociais começou em 2008. De lá para cá, mudou muita coisa?
- Sim. Eu acho que se tornou mais visível, especialmente porque há mais gente usando e mais emoção envolvida. Mas também é preciso ver que esses discursos existem na sociedade. A questão é que nem sempre eram visíveis. Por exemplo, o racismo e o discurso contra as minorias. Isso tudo faz parte da sociedade, mas adquire muito mais visibilidade no espaço online.
Temos visto, como foi o exemplo da confusão de quarta-feira na Assembleia, o ódio no ambiente virtual se transferir para o real.
- Eu acho que, na verdade, uma coisa é reflexo da outra. As campanhas foram muito agressivas, e isso tem um preço. A violência subjetiva, a que vemos como agressão direta, é resultado da violência objetiva, discursiva, sistêmica. As duas coisas estão intrinsicamente relacionadas. Para mim, a única forma de trabalhar com esses discursos é educação. Especificamente nos sites de rede social, em questões como bullying, preconceito etc, é preciso trabalhar nas escolas, com os jovens. Porque o que observamos no nosso grupo é que as pessoas não entendem muito bem os efeitos e impactos de estar nos sites de rede social e publicar qualquer coisa.