Esses dias um amigo achou engraçada uma piada de que a proliferação de mulheres feministas no Facebook era "falta de sexo". Quando eu fiquei ofendida com o comentário, ele sacou a carta do "o politicamente correto está acabando com o humor", argumento com o qual não discordo de todo, mas que não diminuiu o ruborizar das minhas bochechas nem aquietou a pulsante veia que saltava na minha testa.
Como é que as pessoas não enxergam que esse tipo de comentário alimenta uma cultura que, lá na outra ponta, termina com um sujeito se achando no direito de dar um soco na cara da companheira ou estuprar uma garota de minissaia? Pelo mesmo motivo que leva você a estar pensando agora "ah, que chata, essa feminazi louca": visão limitada.
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Eu tenho medo de que a bipolarização cega atinja também a defesa dos direitos e da liberdade das mulheres. O erro histórico do jeito opressivo com que muitos homens nos tratam - literal e no subtexto - é de todo mundo e é para todo mundo resolver, não só as feministas. E parte desse problema está expressa nas brincadeirinhas do cotidiano. Quando tem uma propaganda no rádio fazendo graça que "ser consumista é coisa de mulher" e toda vez que nós, mulheres e homens, endossamos esse discurso, a sociedade regride quatro casas no assunto e não há feminazis o bastante no mundo para nos empurrar de volta para frente.
Portanto, rapaz, não seja bobo. Não vá achando que "essas feministas" estão falando de algo que não lhe diz respeito. O pequeno-machismo-cotidiano é coisa muito séria e é o alicerce para os grandes atos contra a mulher, da agressão física à verbal, passando pelo salário mais baixo e pela repressão sexual. Tudo está ligado. Se não é possível eliminar o machismo imediatamente, é preciso fazê-lo aos poucos. Para isso, cada pequena atitude, cada piadinha de mau gosto que se evita, ajuda a passar adiante a boa cultura em relação à mulher, aquela que não estereotipa, que não massifica, que não incita o ódio e a violência.
Opinião
FêCris Vasconcellos: "Não seja bobo, garoto"
Editora de Entretenimento e Vida & Estilo de ZH Digital escreve na seção de artigos desta terça-feira
FêCris Vasconcellos
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