Momentos de estiagem, outrora de enchente. Nos últimos anos, o Rio Grande do Sul está vivendo opostos climáticos que exigem um novo olhar sobre o meio ambiente.
Um estudo do World Weather Attribution (WWA) – grupo internacional de cientistas especializados – aponta que as mudanças climáticas aumentaram em duas vezes a probabilidade de ocorrência das chuvas históricas que causaram a enchente devastadora no Estado gaúcho. Entre os fatores estão o fenômeno natural El Niño e a emissão de gases do efeito estufa liberados com a queima de combustíveis fósseis.
Estas condições adversas causaram muitos impactos. Até o momento, de acordo com o Monitor da Estiagem, coordenado pela Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), o Rio Grande do Sul possui 391 reconhecimentos federais de situação de emergência vigentes. Já a Defesa Civil estadual informou que mais de 2,3 milhões de pessoas foram afetadas pela enchente.
Tendo em vista estas circunstâncias e o momento de reconstrução do Estado, diversas medidas estão sendo tomadas para contribuir com o reequilíbrio do ecossistema. Para isso, se faz necessário o envolvimento de vários serviços, como os de saneamento básico e energia elétrica.
Um exemplo é o da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) que conta com cerca de 80% da matriz energética “limpa”, ou seja, vinda de fontes renováveis. A projeção da Companhia é alcançar os 100% até janeiro do próximo ano. O vice-presidente de Operações do Grupo Aegea – controlador da Corsan –, Leandro Marin, complementa que este é um dado relevante, considerando que a energia elétrica é um dos principais insumos do saneamento básico. Todo o sistema de abastecimento de água depende de motores, bombas e automação que só funcionam por meio dela.
Ainda, de acordo com o executivo, é preciso ampliar esses esforços, procurando medidas que ajudem a equacionar o ecossistema de uma forma mais ampla. Na reconstrução das infraestruturas, por exemplo, é preciso repensar as estações de tratamento, que são estruturas de grande porte.
– Muitas delas foram construídas, na história da companhia, às margens de rios, o que mostra a necessidade de estudarmos a substituição pela tecnologia de poços profundos, com o objetivo de operar com maior resiliência e proteção do sistema frente a eventos adversos – comenta. Esses têm entre as vantagens não sofrerem interferência de questões climáticas (enchentes ou secas), água do Aquífero Guarani oferece menos risco de contaminação; há mais flexibilidade operacional e agilidade no tratamento, entre outras.
Diante dos períodos de severa escassez hídrica, no começo de 2023, o Estado atravessou uma das maiores estiagens de sua história, o que também exigiu da Corsan um olhar estratégico peculiar e investimentos extra para cuidar de sua matéria-prima, a água que vem do meio ambiente.
Marin afirma que existe um planejamento bastante avançado para combater futuras estiagens e seus possíveis impactos ao sistema. Está incluída a construção e a ampliação de reservatórios de água bruta, barragens, perfuração de poços para que se diminua a dependência de captações superficiais dos rios que sofrem mais com a variação climática e a interligação de sistemas.
– Isso para que adutoras e estações consigam equilibrar o atendimento às cidades, possibilitando trazer água de onde há uma maior oferta hídrica para regiões que sofrem com a estiagem – diz.
De outro lado, a atenção também está voltada a um programa de prevenção de perdas, com a adoção de diferentes tecnologias para auxiliar nesta detecção. De maneira geral, mais de 40% da água captada nos municípios gaúchos não passa nos hidrômetros, o que significa que ela é produzida, mas não chega a abastecer as famílias de uma maneira regular.
Essa perda física na rede pode acontecer por fraude, por uso indevido, mas também por vazamentos ocultos, inimigo invisível da eficiência operacional. Para combater esse desperdício, a Corsan utiliza um satélite de tecnologia israelense, inicialmente projetado para pesquisar água em Marte, para mapear o subsolo e detectar onde está o vazamento, para que a companhia possa atuar com precisão e agilidade de resposta.
– Isso resulta em menor captação de água dos rios e maiores condições de sustentabilidade ao meio ambiente no Estado – ressalta Marin.