No segundo capítulo da série Estrelas do Rio, que mostra atletas brasileiros com chances de medalha na Olimpíada, o personagem é Marcus D'Almeida, o jovem que pode dar ao tiro com arco do Brasil seu primeiro pódio na história.
Nelson Rodrigues foi o primeiro a chamar Pelé de "rei". Em texto em que defendia a convocação do então menino do Santos para a Copa de 1958, o colunista brincava que a idade do craque – 17 anos à época – era "inverossímil". Quem conversa com Marcus D'Almeida também custa a acreditar na data de nascimento impressa em sua carteira de identidade.
Dezoito anos. A estrela do tiro com arco brasileiro recém chegou à maioridade. Ainda assim, carrega um ar sereno no olhar e na fala. A pressão, companheira desde que o talento acendeu alertas de uma possível medalha no Rio, parece não existir. A capacidade de concentração acima da média o deixa alheio ao turbilhão que envolve um atleta com chances reais de estar no pódio olímpico.
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– O foco é o grande diferencial dele. Em um esporte que é muito psicológico, isso é muito importante. É difícil repetir, na competição, o desempenho dos treinos, e o Marquinhos faz isso com frequência. Ele tem uma frieza nos momentos decisivos – elogia Daniel Xavier, 33 anos, companheiro de seleção brasileira.
Foi em 2014, quando ainda tinha 16 anos, que o menino se consolidou na elite de sua modalidade. Na segunda etapa do circuito mundial, veio a prata. Em Nanquim, na China, nos Jogos Olímpicos da Juventude, outra segunda colocação. Mas a maior consagração viria no final daquele ano, na Copa do Mundo de Tiro com Arco, com mais um vice-campeonato. Com o resultado, tornou-se o mais jovem finalista da história da competição.
Há um que de acaso no encontro de Marquinhos, como é conhecido, com o tiro com arco. Morador de Maricá, no interior fluminense, o menino pulou de modalidade em modalidade durante a infância. Sempre foi incentivado a praticar esportes, mas custava a encontrar interesse duradouro por um deles. A escolha foi ajudada por uma questão geográfica: Maricá é sede da Confederação Brasileira de Tiro com Arco (CBTarco), e a entidade desenvolve projetos para crianças e adolescentes. Aos 12 anos, o prodígio iniciava sua caminhada.
Apenas dois anos depois, aos 14, passou a integrar a equipe brasileira e mudou-se para Campinas, no interior paulista. Teve de se adaptar à distância de casa e ao convívio com colegas de equipe mais velhos com quem dividia apartamento.
– Foi difícil no início, mas aos poucos fui me adaptando. Fui muito bem recebido pelo pessoal – resume.
A volta para casa, no início de 2015, coincidiu com um momento complicado nas competições. Já conhecido pelos resultados expressivos do ano anterior, não conseguiu repetir os desempenhos nas primeiras competições da temporada. A tranquilidade, porém, o ajudou a superar a fase.
– Não vi, em nenhum momento, ele preocupado com isso. Não acho que ele tenha passado por um mau momento, são as etapas normais da evolução de um atleta que é muito jovem – lembra Xavier.
– Ele reage muito bem a qualquer acontecimento, mesmo os negativos. Acabou sabendo reagir, foi medalha de ouro no mundial juvenil. Isso tudo depois de se criar toda uma expectativa em cima dele – lembrou Eros Fauni, diretor técnico da Confederação Brasileira de Tiro com Arco, em entrevista a ZH no ano passado.
Ainda que a aparente frieza possa ser interpretada como falta de ambição na busca dos resultados, uma história da não tão distante infância ajuda a mostrar seu espírito competitivo. A escolinha em que fazia natação fechou. Ele já estava acostumado às aulas e competições internas. Ficou inconsolável.
– Ele chorava muito. Eu me preocupava se era porque ia sentir falta dos amigos, mas também ofereci de ele fazer natação em outro lugar. Foi aí que soube por que estava tão chateado. Ele me respondeu: "Eu quero medalha. Lá (na outra escolinha) não tem medalha" – lembra a mãe, Denise Torres Carvalho.
– Eu sempre entro nas competições para vencer, mas também entendo a lição das derrotas como algo muito importante. Sou competitivo, é claro, mas sei aceitar e aprender com as derrotas – afirma Marcus.
Como se vê, o Marquinhos maior de idade e candidato ao pódio olímpico já não escancara a sede pela vitória com tanto alarde, mas seu objetivo final é o mesmo do menino que se lamentava para a mãe. Quanto a isso, ele pode ficar tranquilo nos Jogos Olímpicos. Lá, tem medalha.
Acompanhe a série Estrelas do Rio, que apresenta oito atletas brasileiros com chances de medalha na Olimpíada
* ZH Esportes