Neste sábado o Avaí promoveu na Ressacada um encontro médico para debater a medicina esportiva no Brasil, principalmente relacionada à lesões de joelho, bastante comuns no meio do futebol. Os eventos, 4ª Jornada do Departamento Médico do Avaí Futebol Clube e 7ª Jornada do Litoral de Cirurgia do Joelho, contaram com a presença dos médicos do Avaí, Joinville, Criciúma, Cruzeiro, Chapecoense e de José Luiz Runco, ex-médico da Seleção Brasileira por 16 anos e doutor responsável pelo Flamengo.
Em conversa na CBN Diário com a reportagem do Diário Catarinense, Runco contou histórias da sua experiência de mais de 35 anos envolvida com o futebol, período vivido no Iraque de Saddam Hussein e perspectivas sobre o futebol brasileiro.
Você conhece muito bem a CBF. Como você avalia essa corrupção junto coma Fifa?
A corrupção influencia todo o Brasil. Não é apenas futebol. A justiça está feita para isso e cabe a nós torcer para que essas coisas melhorem. O país é novo, e nessa democracia as coisas estão começando a se exteriorizar agora. E isso é bom para que possa se criar pessoas sérias.
E o que a CBF deve fazer?
A CBF tem que ajudar os clubes. Os times têm que se estruturarem e evitar a saída precipitada de atletas e formar campeonatos mais atraentes. Sabe o que me preocupa? É ver crianças não usando a camiseta do seu clube aqui do Brasil e sim de um clube europeu. Isso me preocupa muito. Você não vê o garoto com a camisa do seu time. É preciso retomar a credibilidade no futebol.
Sobre medicina. Como está o Brasil no mapeamento de dados dos nossos atletas?
Isso ainda é muito embrionário no Brasil. A nossa cultura não é muito de estatísticas. Quando criamos a Comissão Nacional de Médicos do Futebol, tentamos voltar um dos objetivos era estabelecer um hall de informações para que os médicos tivessem conhecimento e clubes soubesse o histórico de cada atleta com dados médicos e necessidades de trabalhos específicos. Isso melhorou muito, hoje há mais conversas entre os médicos. Mas ainda há para avançar.
Mas os atletas não ficarão preocupados com tanta informação sobre eles?
Eu acho que o jeito que o futebol está profissional eles terão que entender isso. E eles terão que se cuidar. Evidente que nem todos podem evitar lesões, mas terão que se cuidar, dormir cedo, fazer trabalhos preventivos. O futebol está cada vez mais profissional e o nível de todas as competições é forte. E quem avaliza esse atleta tem que deixar emoção e torcida de lado. Tem que avalizar de forma profissional para esse atletas render, ou não.
Você já vetou algum jogador no Flamengo?
Teve um jogador que foi contratado pelo Flamengo que eu disse: ele não vai ser o que vocês estão esperando. Ele não será um atleta que vai driblar meio time e fazer gol. Ele tem potencial e vai jogar. Vetar é outra coisa, significa que ele não pode jogar mais futebol em lugar algum. Como médico, cabe recomendar e avisar que ele não vai render o que vocês estão esperando. E esse atleta rende muito bem, como era previsto.
Os atletas se profissionalizam cada vez mais cedo. Isso prejudica a formação deles? Inclusive no aspecto de saúde?
Eu acho isso ruim. Acho que isso tira as características de leveza e da espontaneidade dos jovens. Transforma ele com um esquema carregado e pesado. Ao mesmo tempo expõe ele à mídia que o trata como um deus que irá resolver todos os problemas do clube. E não vai. Há uma carga familiar e dele que será solução de tudo que está se passando. Alguns vão para Europa, não rendem, voltam para o Brasil e a carreira vai descendo a ladeira porque a cabeça não estava pronta para tudo isso.
Essa estrutura atual implica em lesões?
Eu acho você expõe o menino a lesões muito cedo. Ele tem desgastes, um exemplo de lesões ligamento no joelho, ocorre cada vez mais cedo, com 15, 16 anos. O volume de jogos é grande, a cobrança é grande e os campos também não tem tanta qualidade brasil afora. Acho que não deveria ter sub-15. Os europeus que você expões o atleta muito cedo. o sub-17, sub-21, sub-23. Isso poderia ser revisto.
E qual seria uma sugestão para aliviar isso?
Tem que se rever essa estrutura. Há um tempo tinha o campeonato de aspirantes e funcionava muito bem. Eu sei que gera mais despesas e vão gastar mais dinheiro. Mas é um tempo melhor para preparação e também um espaço para recuperação física de atletas. O Barcelona tem um média de 18 a 19 jogadores no profissional. Os demais são buscado na equipe aspirante.
Você trabalhou no Iraque na década de 1980. Como foi? Verdade que operou um membro da família Hussein?
Essa história é muito curiosa. Fui à Bagdá com 30 anos em janeiro de 1986. Tinha acabo de ser Campeão Mundial de Júnior pela Selação, isso repercutiu e veio uma proposta para trabalhar na seleção do Iraque, planejando a Copa de 1986. Cheguei lá, e quatro dias depois eu me vi tratando o filho do Saddam Hussein, o Uday Hussein. E logo depois operei um sobrinho dele. Era bola ou bule, opera ou opera. Foi uma cirurgia de menisco e deu tudo certo. Isso me deu muita moral e fiquei por dois anos lá.
Como é a cultura árabe do futebol?
Eles são fãs. Muito. Agora o Iraque caiu depois de todas essas coisas políticas, mas era o melhor futebol do mundo árabe. Tivemos boas atuações naquela Copa, apesar das derrotas.
O que significa o 7 a 1 para você?
Como brasileiro é uma derrota que marcou muito. Dolorida. Como profissional, que viveu aquela situação é uma coisa muito chata. Marcou muito ver teu time tomar sete gols. Como amante do futebol, espero que seja a marca de uma mudança e que possamos dizer: tomamos de 7 a 1 mas agora estamos grandes novamente.