A Faculdade de Educação (Faced), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), recebeu parte da história do Movimento Negro brasileiro. É que a sala 408 do prédio localizado em Porto Alegre é, desde a semana passada, o abrigo de 21 mil itens do acervo pessoal do poeta gaúcho Oliveira Silveira (1941-2009).
Nascido em Rosário do Sul, na Região Central, Silveira foi um dos mentores da criação do dia 20 de novembro como o “Dia Nacional da Consciência Negra” e do Grupo Palmares. A reunião dos materiais foi acertada entre UFRGS, Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e Instituto Oliveira Silveira, administrado pela família do autor.
— Acreditamos no quanto esse arquivo pessoal pode inspirar pesquisas. Esperamos incremento na produção acadêmica na temática étnico-racial, na profissão docente, na biografia (do autor), nos estudos de trajetória inspirados nesse acervo — afirma Dóris Bittencourt Almeida, responsável pelo setor de Memória da Faced.
Segundo ela, a faculdade mantém acervo de outros professores no espaço. Além disso, acrescenta que a parceria com a universidade segue preceitos do próprio intelectual:
— Oliveira Silveira é egresso do curso de Letras da UFRGS, fez disciplinas na Faculdade de Educação, que é uma instituição inclusiva no Rio Grande do Sul: ele ficaria feliz com isso que está acontecendo.
O acervo pertence ao Instituto Oliveira Silveira e estava guardado no apartamento onde o poeta viveu em Porto Alegre. A curadora da coleção é Sátira Machado, professora da Unipampa e biógrafa do autor. Documentos, recortes de jornais, cerca de 600 livros, instrumentos musicais, fotografias, vídeos, fitas cassetes, peças de vestuário e objetos decorativos integram o conjunto.
Os manuscritos deixados por Oliveira Silveira serão objetos de análise dos estudiosos da universidade nos próximos anos, explica Sátira:
— Grande parte desses documentos precisa ser digitalizada e disponibilizada na internet. Vamos observar, com rigor científico, esses manuscritos, todas as anotações dele estão ali. Ele escrevia bastante: há poemas inéditos, músicas, correspondências com pessoas de todas as partes.
Os materiais foram levados para a sala na última quarta-feira (12). O espaço será inaugurado no dia 16 de agosto, data de aniversário do poeta. Não há uma definição de como será feita a visitação ao acervo: isso será definido nos próximos dias.
— Não é somente um arquivo pessoal, mas um resgate das histórias que subsidiam as disciplinas de Educação das relações étnicas e raciais que estão se multiplicando nas universidades. Para fazermos uma educação antirracista, é preciso conhecer a história da negritude no país — acrescenta Sátira, também coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) do campus Jaguarão da Unipampa.
Espaço municipal
A prefeitura de Porto Alegre planeja há anos reunir o acervo do intelectual gaúcho. Isso estava previsto para ocorrer no fim de 2021, mas o plano não teve andamento por causa de uma interdição: uma avaliação do local que receberia os materiais, o Centro de Referência do Negro, no bairro Meninos Deus, indicou problemas estruturais.
A previsão é de que em agosto seja publicado o edital de um “hub” de cultura e inovação que reunirá espaços e iniciativas do Movimento Negro em Porto Alegre. A administração municipal estuda utilizar um imóvel próprio no bairro Cidade Baixa para receber as iniciativas.
— Não tem como falar da história do negro em Porto Alegre sem mencionar o nome de Oliveira Silveira. Esse complexo será inspirado nele. É um desejo grande colocar em prática esse espaço, que vai ser, tenho certeza, uma grande entrega para a Capital — comenta Adriana Santos, coordenadora de Direitos e Políticas de Igualdade Racial da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SMDS).
Segundo Adriana, a expectativa é que o espaço seja inaugurado no próximo ano. Os recursos serão da prefeitura e do Banco Mundial.