
Cerca de R$ 8,8 bilhões seguem "esquecidos" pelos clientes em bancos, consórcios, cooperativas e outras instituições financeiras, conforme indica o painel Valores a Receber do Banco Central.
Com o prazo para resgate findado em outubro de 2024 e sem um novo edital por parte do Ministério da Fazenda, beneficiários nem o Tesouro Nacional podem usar dos recursos.
A Lei 14.973/24, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em setembro passado, estabeleceu que o valor sem saque pode ser incorporado ao Tesouro Nacional. Para isso, antes, o Ministério da Fazenda deve providenciar a publicação, no Diário Oficial da União, de um edital com um nova data para que os titulares das contas bancárias ou representantes de falecidos contestassem o recolhimento.
O edital trará, além do valor "esquecido", a instituição depositária, a agência e o número da conta do depósito e estipulará prazo de 30 dias, contado da data de sua publicação, para que os respectivos titulares contestem o recolhimento efetuado.
Ainda não há data para a publicação deste novo edital, que deve ser a última chance de resgate desses R$ 8,8 bilhões — R$ 6,7 bilhões somente de pessoa física.
Justiça pode ser alternativa
O Banco Central disponibilizou em 2022 o Sistema Valores a Receber (SVR), em que o cidadão ou empresas podem conferir e fazer o resgate das quantias deixadas em contas bancárias. O prazo oficial para busca acabou em 16 de outubro e parte das quantias deixaram de ser sacadas.
Embora sem poder sacar, a consulta aos valores pode ser feita pelo site do Banco Central (leia mais abaixo). Há também a possibilidade de judicializar a devolução.
— O titular da conta bancária não precisa se desesperar nesse primeiro momento, porque nem a lei nem a portaria, falam que o Tesouro irá incorporar esses valores sem um novo edital. Haverá um novo momento, uma nova etapa, para que as pessoas consigam reaver esse valor — destaca Raul Kazanowski, advogado no escritório CKA Advocacia e associado ao Instituto de Estudos Empresariais (IEE).
O que é o Sistema Valores a Receber
O Sistema Valores a Receber (SVR) é uma plataforma onde é possível consultar se empresas, mesmo aquelas que foram encerradas, e pessoas físicas, inclusive falecidas, têm dinheiro esquecido em algum banco, consórcio ou outra instituição financeira. Caso tenham, podem saber como solicitar o valor.
Como deve funcionar após a publicação do edital
A lei determina que o novo edital a ser publicado pelo Ministério da Fazenda deve trazer as quantias recolhidas, a instituição onde os valores estão esquecidos, a natureza do depósito, a agência e o número da conta.
O órgão deve estabelecer um prazo de 30 dias, contado da data da publicação do edital, para que os titulares contestem o recolhimento dos recursos de forma administrativa — sem judicialização. Nessa circunstância, o interessado precisa acionar as instituições financeiras para reaver o dinheiro esquecido ou solicitar de acordo com a orientação divulgada.
A contar da data da publicação do edital, pessoas e empresas devem ter um prazo de seis meses para solicitar o pedido de forma judicial. Somente após esse período é que os valores serão recolhidos pela União e serão apropriados pelo Tesouro Nacional como receita orçamentária primária.
O advogado Julio Carlos Blois Vaz, presidente da Comissão Especial de Direito Bancário da OAB/RS, reforça que esse protocolo é uma determinação legal. Ou seja, o Ministério da Fazenda precisa atender a legislação e publicar o edital.
Há data para publicação do edital?
Zero Hora entrou em contato com o Ministério da Fazenda para confirmar se há previsão para a publicação do novo edital, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
Como consultar valores a receber
Qualquer pessoa física ou jurídica pode consultar pelo site do Banco Central se tem dinheiro esquecido em algum banco, consórcio ou outra instituição financeira. É possível verificar inclusive valores deixados por pessoas falecidas. Confira o passo a passo:
- Acesse o site do Sistema Valores a Receber (SVR) e procure por "Consulte valores a receber"
- Pessoas físicas devem informar o CPF e data de nascimento
- Pessoa jurídica deve informar o CNPJ e data de abertura da empresa
- Caso queira consultar valores de pessoas falecidas, é necessário informar o CPF e a data de nascimento dela
- Clique em "Acessar o SVR" para verificar como solicitar o recurso disponível
O cidadão será encaminhado para o portal gov.br. Pessoas físicas precisam ter a conta no nível prata ou ouro, com a verificação em duas etapas habilitada. Já pessoas jurídicas, ao realizarem o login, devem selecionar Certificado Digital, vinculando a conta gov.br de uma pessoa física com conta no nível prata ou ouro, com a verificação em duas etapas habilitada.
Em 2024, para fazer o resgate, era necessário ter uma chave Pix, já que seria o modo de envio dos valores.
Recomendação é aguardar
Julio Carlos Blois Vaz, presidente da Comissão Especial de Direito Bancário da OAB/RS, recomenda que pessoas que ainda tenham "valores esquecidos" nas instituições financeiras aguardem a publicação do novo edital do Ministério da Fazenda, antes de partirem para a judicialização.
— O ideal seria aguardar a publicação desse edital para que as pessoas possam ter mais segurança. Ele terá que ser publicado — pontua.
O mesmo é apontado pelo advogado Raul Kazanowski, do escritório CKA Advocacia, associado ao Instituto de Estudos Empresariais (IEE). O especialista recomenda a espera, considerando que a entrada com uma ação judicial possui prazos mais alongados e burocráticos.
— Se ela não depende necessariamente desses valores, seria interessante aguardar o edital, porque ele vai vir com uma regulamentação, que irá facilitar e agilizar o processo.
Como judicializar um pedido de recolhimento de valores
Caso o cidadão deseje solicitar o seu resgaste, ele pode entrar com um pedido a qualquer momento na Justiça, sem necessariamente precisar do edital do governo federal. A Constituição Federal garante esse direito. Isso não significa, entretanto, que a demanda será atendida.
— Se o Ministério da Fazenda, o Banco Central e as instituições financeiras não regularizarem a situação para que as pessoas saquem esses valores, é possível buscar via judicial. Elas terão que comprovar que há valores naquela conta, que elas são titulares — pontua Kazanowski.
Para isso, o cidadão deve procurar um advogado ou a Defensoria Pública e apresentar a sua questão. O profissional irá orientar a documentação necessária e irá entrar com a medida judicial.
Uma outra alternativa citada pelo advogado Raul Kazanowski é acessar o site consumidor.gov.br. No canal, é possível fazer contato com a própria instituição financeira em que o dinheiro estava depositado e verificar, dentro dos mecanismos da organização, se ela consegue o resgaste desses valores.
O especialista também cita a possibilidade de entrar com uma ação no Juizado Especial de Pequenas Causas (JEC) de modo gratuito, caso os valores a serem resgatados sejam inferiores a 40 salários mínimos. A presença do advogado é opcional em ações que envolvam uma indenização de até 20 salários mínimos.
Cuidado com golpes
Durante esse processo, é importante estar atento para não cair em golpes.
— É sempre importante alertar que, sempre que a pessoa quiser ajuizar uma demanda, ela deve procurar um advogado, que ela confie e conheça. É preciso ter muito cuidado com os golpes, com mensagens de pessoas falando em dinheiro a receber, depósitos — diz Julio Carlos Blois Vaz.
O próprio Banco Central oferece orientações sobre o que é importante estar atento com relação aos valores a receber:
- O único site onde pode ser consultado valores é o do Banco Central
- Todos os serviços do Valores a Receber são totalmente gratuitos
- O Banco Central não envia links nem entra em contato com o cidadão para tratar sobre valores a receber ou para confirmar dados
- Somente a instituição que aparece no Sistema de Valores a Receber é que pode contatar o solicitante e ela nunca irá pedir senha
- Não clique em links suspeitos enviados por e-mail, SMS, WhatsApp ou Telegram
*Produção: Carolina Dill
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