O desempenho acanhado da economia brasileira em 2019 mostra a falta de fôlego do país na retomada após a recessão. Especialistas avaliam que dificuldades em impulsionar o consumo de bens duráveis, falta de investimento público, queda nas exportações e a recessão na Argentina contribuem para o avanço menos vultoso do Produto Interno do Bruto (PIB), que cresceu 1,1% no ano passado, abaixo do 1,3% registrado em 2017 e em 2018.
A falta de aplicações mais expressivas no setor público acaba freando o aquecimento da economia, segundo o professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Marcelo Portugal. No período, o consumo do governo caiu 0,4%. O fim da recessão na construção civil, que avançou 1,6%, após cinco anos no vermelho, é um dos fatores que explanam esse entendimento, segundo Portugal:
— O dado da construção civil é positivo, mas é puxado basicamente pela construção privada, de casas, etc. Toda aquela história de obras do setor público não está andando.
O professor da UFRGS destaca que alguns fatores externos, como a recessão da Argentina, um dos principais parceiros comerciais do Brasil, ajudaram a puxar a economia brasileira para baixo. Uma das principais vitórias do governo no fim do ano passado, a reforma da Previdência não conseguiu encorpar o resultado, pois provocará efeito apenas a médio ou longo prazo, conforme Portugal.
Ainda na questão interna, o arrefecimento da indústria de extração mineral (-1,1%) após a tragédia de Brumadinho ajudou a impulsionar o enfraquecimento do PIB, segundo a diretora da área de macroeconomia e análise setorial da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro. A diretora diz que a incerteza elevada que ronda a economia também contribui por esse cenário de crescimento lento.
— Nessa incerteza, temos aspectos externos, mas também internos, como nosso ambiente político e o impacto disso para as reformas, a própria frustração com o crescimento doméstico. São elementos que acabaram mantendo a incerteza elevada e a gente sabe que isso afeta os investimentos e o consumo — afirma Alessandra.
Como um fato curioso, a economista cita a frustração em relação ao impacto esperado com a liberação de recursos do FGTS. Alessandra destaca que o baixo valor liberado e o uso da maior parte da verba para pagamento de dívidas em detrimento do consumo não aqueceram a economia.
O economista Claudio Considera, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), avalia que a economia no país está “sendo sustentada pelo consumo das famílias”.
— O consumo das famílias cresceu 1,8% e o PIB 1,1%. Então, compensou as quedas das nossas exportações e do consumo do governo.
Explicando as dificuldades enfrentada pela indústria, que registrou avanço de 0,5%, na retomada após a recessão, Considera destaca que o consumo da população cresce em relação ao setor de serviços, que registrou melhor desempenho proporcional no PIB.
— 50% do consumo das famílias é de serviços. Não compram bens duráveis, que é o que a indústria produz. Vocês está sustentando a economia com base no consumo de serviços. Não tem economia que tenha dinamismo com isso.
A continuidade do número elevado de desempregados no país também contribuiu para travar o crescimento econômico, de acordo com Considera.
Logo após a divulgação dos dados do PIB, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia informou, por meio de nota, que o aumento no consumo das famílias e do investimento, acompanhado por uma queda do consumo do governo, reforçam tendência de crescimento do PIB privado em substituição do setor público.