Quando Mary McCartney e os três irmãos eram novinhos e passavam as férias na Escócia, seu pai se esforçava para ensinar tudo sobre os alimentos que brotavam da terra.
Nos dias de hoje, todo mundo quer entrar para o showbiz e - ao menos na internet -, parece que todo mundo já entrou.
Mídias digitais e tradicionais, incluindo jornais e revistas, vêm construído há anos uma presença em vídeo na internet. Entretanto, até o momento só fizeram vídeos de baixo custo, filmados com apenas uma câmera e exibindo pouco mais que cabeças falantes.
Contudo, recentemente, grandes grupos de mídia como Conde Nast, The Wall Street Journal e Univision apresentaram pela primeira vez aos anunciantes exemplos ambiciosos de programas originais.
Empresas que já produzem conteúdos para a web, como o Yahoo e a Hulu, também anunciaram possibilidades muito mais amplas para seus vídeos.
Como resultado, os espectadores foram bombardeados com inúmeros programas para a internet - 11 do Yahoo, 14 da AOL e, acredite se quiser, 30 da Conde Nast, incluindo um que oferece aos espectadores a possibilidade de acompanhar o editor da Vogue, Hamish Bowles, enquanto ele faz compras ao redor do planeta.
Entre os quatro programas criados pela Hulu, a série "Behind the Mask" é um "documentário cômico" dedicado ao mundo dos mascotes de equipes esportivas.
Essas empresas progridem rapidamente, pois acreditam que os espectadores estão tão acostumados a ver programas em aparelhos como celulares e tablets, que os limites entre a televisão tradicional e os vídeos online estão cada vez menos claros.
Contudo, as empresas também agem com certo grau de desespero, uma vez que muitas podem cobrar mais caro por anúncios em vídeos do que por banners em sites, cuja função está desaparecendo, em função de tecnologias comerciais baseadas em algoritmos.
Os anunciantes também estão deixando de utilizar propagandas veiculadas por mídias tradicionais, preferindo investir em sites como o Facebook, capaz de alcançar públicos enormes.
Empresas de mídia tentaram atrair executivos em Nova York na semana passada, durante um evento de propaganda e marketing chamado Digital Content New Fronts, que tenta reproduzir o sucesso da reunião das redes de televisão, que será realizada no fim do mês. Em festas open-bar luxuosas, empresas que não eram conhecidas por produzir programas tentaram convencer anunciantes a patrocinarem séries, ou até mesmo canais inteiros.
Ainda assim, mesmo com o aumento no volume de produções "premium", não se sabe se os anunciantes estão realmente investindo em propaganda. De acordo com dados da empresa de pesquisa de mercado eMarketer, os gastos com vídeos digitais - embora estejam crescendo - devem chegar a apenas US$ 4,14 bilhões em 2013, muito longe dos US$ 66,35 bilhões que serão investidos no mercado televisivo.
Muitos anunciantes afirmam temer que, com tanto conteúdo novo sendo lançado em plataformas diferentes, o público de cada programa seja ainda mais fragmentado e microscópico do que já é.
- Não importa quanto tempo você consiga manter a atenção - afirmou Rino Scanzoni, CIO do Group M, a respeito do excesso de programas - para mim, esses programas todos acabam parecendo uma coisa só. O Group M é uma das maiores agências de compra e planejamento de mídia do mundo.
Ben Winkler, CDO da agência de propaganda OMD, que representa marcas como a Pepsi e a Nissan, chamou o movimento de "TV a cabo elevada ao enésimo grau".
- Estamos falando de públicos mínimos, de TV de nicho, se preferir - afirmou - Se apenas 100 pessoas estão assistindo, vale a pena investir tempo e energia?
A AOL é uma das empresas que mais apostam em "vídeos premium", ou seja, vídeos que a empresa espera que possam gerar um faturamento maior, em vista do valor de produção. Tim Armstrong, CEO da empresa, afirmou em uma entrevista - Os consumidores estão adotando vídeos online com muita rapidez: para se envolver nesses meios, são necessários grandes investimentos em aparelhos e redes, investimentos feitos pelas pessoas mais talentosas e criativas do setor, além de investimentos em formas de mensurar o número de expectadores. Por isso acredito que esse setor esteja prestes a explodir.
Boa parte dos programas apresentados na semana passada não partia de um roteiro, mas de reality shows ou do modelo da TV a cabo - programas temáticos sobre assuntos como carros, cuidado com os filhos e cozinha - sempre em torno de um apresentador carismático. O Yahoo, por exemplo, fará um programa chamado "Losing Your Virginity With John Stamos", uma série na qual Stamos entrevista outras celebridades sobre como foi sua primeira experiência sexual.
Algumas empresas de mídia também prometeram um volume de acessos garantido aos anunciantes. A AOL anunciou uma nova parceria com a Nielsen, para ir além dos cliques na hora de calcular a quantidade de espectadores. Eles utilizarão um sistema que marca o vídeo digital e mensura dados demográficos, localização e quantidade de pessoas que assistem ao programa.
Uma das possíveis limitações para os programas em vídeo digital online é a quantidade de formas por meio das quais as séries podem ser apresentadas. Algumas empresas oferecem as séries completas, ao passo que outras preferem lançar um capítulo por semana. Algumas séries têm 10 capítulos, enquanto outras têm 20. Para homogeneizar essas irregularidades, alguns produtores prometem que todos os vídeos poderão ser acessados sob demanda a partir de uma série de sites.
Além disso, não há garantias de que esses programas chegarão ao público-alvo. John Landgraf, presidente da FX Networks, destacou que as redes de TV geralmente criam seis novos programas por temporada. Por outro lado, as mídias digitais oferecem dezenas de programas, o que os anunciantes consideram um exagero.
- O mercado fica cheio demais - afirmou Landgraf.
De forma irônica, programas de vídeo online são considerados mais bem sucedidos quando passam na TV a cabo, o que lhes garante um público maior. Dois exemplos de programas que fizeram essa passagem são o "HuffPost Live", cujas notícias e comentários serão apresentados pela AXS TV, e o "Glenn Beck's TheBlaze", que foi selecionado pela Dish Network no ano passado, e na semana passada pela Cablevision, aumentando sua presença em Nova York.
Além disso, o canal AwesomenessTV, famoso no YouTube, foi comprado pela DreamWorks Animation por US$ 33 milhões.
Outro chamariz para os anunciantes foi a promessa de que o produto se tornasse parte do programa, uma prática cada vez mais comum no setor, chamada de "conteúdo de marca" ou "entretenimento de marca".
Recentemente, a AOL deu início à segunda temporada de um programa sobre mulheres que fazem tudo de carro, chamado "Little Women, Big Cars", que teve mais de oito milhões de acessos, em parte por conta do entusiasmo de um dos patrocinadores, a Allstate.
Para a segunda temporada, os autores incluíram uma nova personagem, uma funcionária da Allstate que solta pérolas como - Minha missão é transformar dias ruins em dias incríveis!
Karen Cahn, gerente geral do setor de vídeos online da AOL, afirmou que a empresa acompanha de perto os comentários para saber se o público se sente desconfortável com o merchandising - Até aqui, tudo vai bem - afirmou.
Nos bastidores, os executivos veem o investimento em mídias digitais com um misto de prazer e desconfiança.
- Não ficaria surpreso se o McDonald's dissesse que entraria no mundo das séries em vídeo - afirmou Landgraf, do canal FX - Ao lado da Staples e da Camper World.