Por Tali Bezerra
Com discos nas listas dos mais vendidos do mundo, 15 Grammys acumulados ao longo da carreira, Adele volta a ser assunto em 2020. E não por um novo álbum, mas pela sua silhueta.
Conhecida do grande público por ser uma mulher gorda, o corpo magro apresentado na primeira foto que a artista britânica publicou este ano em sua conta no Instagram rendeu, até o momento, mais de 5 milhões de curtidas e uma infinidade de comentários. A questão que fica é: por que a forma física de uma artista de tamanha magnitude gera tanta repercussão?
Antes de mais nada, é preciso lembrar que, quando surgiu nas nossas casas e reproduzíamos suas músicas no repeat, Adele era citada como uma artista gorda. Seu corpo foi criticado por Karl Lagerfeld, da Chanel, em episódio que circulou o mundo. E não foi o único. Mesmo assim, ela defendeu o direito de amar o seu corpo como ele era.
Saber que uma mulher com uma forma física tida como errada conseguia alcançar lugares tão importantes certamente era um alento para outras que têm o corpo parecido, e que passaram a vida ouvindo que não eram capazes. A representatividade, aliás, sempre foi uma bandeira da cantora, não somente em relação ao corpo, mas a outras causas.
Nos últimos anos, com o hiato de shows, ficou mais raro ver a artista em cena. Com a vida privada resguardada, as fotos publicadas em suas redes são as nesgas do cotidiano de Adele que nos permitem revê-la.
É possível dizer que a surpresa deveu-se à sua aparição restrita? Talvez sim. Mas a verdade é que, ainda que estivesse em plena atividade, a mudança no seu corpo seria notícia.
A partir de 2019, nas suas poucas aparições, a mudança em seu corpo começou a ser evidente, culminando na imagem que vimos se multiplicar nesta quarta-feira (6) na internet. É possível dizer que a surpresa deveu-se à sua aparição restrita? Talvez sim. Mas a verdade é que, ainda que estivesse em plena atividade, a mudança no seu corpo seria notícia.
O corpo feminino, ao que parece, é domínio público. Sobre ele se lançam os mais diversos padrões, dentre os quais - atualmente - o da magreza. E ver uma mulher que defendia o seu direito de ter um corpo gordo e ser respeitada por ele tornando-se magra, para muitos, é a prova de que o seu discurso inicial era falso. Ela não tem o direito de mudar de ideia.
Por outro lado, e se, de fato, o discurso de aceitação declarado por Adele fosse apenas uma armadura, o que nós temos com isso? Por que deveríamos estar discutindo o que uma mulher de 32 anos, bem sucedida, saudável e que não pediu opinião sobre o seu próprio corpo deve decidir sobre ele? Estamos falando do corpo de outra pessoa, sobre o qual não temos agência e nem nos caberia ter. É da ordem do individual, não nos afeta!
O que admito ser uma questão de fundo e que não pode ser perdida é que, para algumas pessoas, a aparição repentina da artista com a forma atual e, principalmente, o modo como as pessoas a parabenizam por isso - como se ser magra fosse elogio! - pode levar mulheres gordas a se sentirem inadequadas e a acreditarem que uma solução milagrosa para alcançar o corpo "perfeito" é possível. E não é.
Em casos como este, precisamos sempre destacar que emagrecer não é conquista e engordar não é fracasso. Por mais clichê que pareça, a vida é mais que um número na balança. Adele também.
Tali Bezerra é jornalista, doutoranda em Comunicação e Informação pela UFRGS e escreve sobre moda plus size no Instagram @emeutamanho